Na
ansiedade de ser "presidente", Temer desenterra o "Brasil do
futuro", menos de 8 por cento acreditam
HELIO FERNANDES
A cada
dia indecisão, recuo, retrocesso, desencontro com ele mesmo e com os que o
seguiam, sem convicção, apenas com ambição e interesse pessoal. Antes mesmo de
assumir, a fragilidade do eventual Michel Temer é uma sofrida fratura exposta.
Esperava muito do ortopedista Eduardo Cunha.
Os males
do vice, agora se espalharam perigosamente e o "medico" amigo já não
pode ser consultado. Primeiro porque não está mais á disposição, como antes. E
segundo, porque existe mais do que uma
suspeita. Ele já não é a presumida ou reconhecida solução e sim, confirmada
complicação. Mas essa descoberta, tardia, está longe de ser a mais
importante.
Logo que
montou o espetáculo vicioso e viciado da traição-conspiração, foi assumindo
compromissos resumidos numa palavra: inacreditáveis. E foram desacreditados por
ele mesmo, pela incapacidade ou incompetência de cumpri-los. Sem nenhuma ordem
hierárquica, palavra que Temer detesta, citemos com a mesma desordem que está
nos planos, na mente e no coração do vice. E constatemos, surpreendidos e
perplexos: sobrou apenas à obsessão de passar de vice a "presidente",
não interessa quantas aspas sejam necessárias.
O
objetivo inicial e fundamental, era fugir o mais possível do modelo usado pela
presidentA, como ele chamava nos tempos de "vice decorativo", mas
servo, submisso e subserviente. Não conseguiu. O primeiro descompasso foi à
redução do numero de ministros, "pela metade". Não igualou, mas está
perto. A qualidade e o comportamento, reprováveis e reprovados. Alguns nomes,
vergonhosos, como os da Justiça, até com mais
vetos do que aceitações. E ainda sem titular, reticências insuperáveis.
O
Ministro da Ciência e Tecnologia, concessão e lembrança verdadeiramente
incestuosas, pelo nome e pela profissão. Convidou e mais do que isso, confraternizou
com um pastor criativista evangélico. Temer tem poucos conhecimentos, no
entanto sabe que o Estado é laico. Mas ao preencher esse ministério, confundiu com
aético, só foi atentar para isso, depois.
Na hora
lembrou que a "bancada evangélica", reacionarissima, tem 90
deputados. Convidou logo o futuro "presidente", com as palavras,
"vamos orar". Aceitou imediatamente. Temer deve incorporar á sua
equipe na Câmara, a bancada da bola, da bala. Com os corruptos ou sem escrúpulos. Romero
Jucá e Eliseu Padilha, que controlam no Jaburu a lista de adesões, comunicaram
ao chefão: "Atingimos 400 deputados, podemos aprovar o que
quisermos".
Talvez
por causa dessa vantagem imaginaria, confessou a vários jornalistas, individualmente:
“Não nomearei para Ministro alguém que esteja envolvido ou citado na
Lava-Jato". Não demorou, mudou de posição, refletiu (?), concluiu: seria
injustiça, ele também é citado. E apesar de passar a "presidente interino",
(a partir da quarta feira depois de amanhã), pode e deve ser cassado pelo TSE.
Ele e Dona Dilma, já "afastada". Os dois deviam ter perdido os
mandatos, se o TSE não tivesse posição dúbia sobre o assunto: "Não devemos
nos manifestar, enquanto a Câmara não resolver o impeachment".
Equivoco do TSE, repetido pelo Supremo
Não posso
praticar a injustiça de imaginar, admitir ou acreditar, que os 7 Ministros do
TSE, não saibam estabelecer a diferença entre crime de RESPONSABLIDADE e a
CASSAÇÃO da chapa. Ou considerarem que os dois julgamentos não podem ocorrer
simultaneamente. Também não existe prioridade para um julgamento ou o outro. O
Legislativo pode começar e terminar o processamento do impeachment, com a
certeza de que isso cabe a ele, exclusivamente. E o fato do TSE se manifestar
antes ou depois, não provoca nenhuma colisão.
Pode
haver condenação ou absolvição, duas condenações ou duas absolvições, nenhuma
critica. O que é impossível é a omissão. Que já vem acontecendo. Tramitando ha
4 meses e agora com pedido de mais 90 dias, o vice Temer já ganhou uma
sobrevida que não deveria ter. "A plebe vil e ignara das ruas", (royalties
para o notável J. E. de Macedo Soares) foi ludibriada e enganada pelo TSE. Que
ainda pode se reabilitar, realizando o julgamento no menor prazo possível. Não
esperar para 2017. Temer, impopular e vulnerável, tem apenas 8 por cento nas pesquisas.
O TSE se
omitiu, grave mas não definitivo. O Supremo, gravíssimo, optou pela cumplicidade.
Voluntaria, irrecuperável, insanável. Não teve consciência para perceber que
movimentava pessoas como se fossem pedras de xadrez. E que retirava ou colocava
personagens na presidência da Republica, um cargo que poucos podem alcançar.
Pois os Ministros do Supremo fizeram o impensável. Ha 4 meses, por unanimidade,
declararam réu, o corrupto Eduardo Cunha. E nos mesmos 4 meses, entre data - venia
e divergências que não conseguem superar, mantiveram esse mesmo corrupto,
execrado por todos, como pró homem da Republica.
Se 1 mês
ou 2 depois de transformá-lo em réu, tivessem feito o julgamento que fizeram na
quinta feira, o país não teria como terá a partir das próximas 48 horas, dois presidentes.
Um eleito pelo voto direto e afastado. E outro, vice sem voto, alçado á
condição de presidente, não importa que interino. A confusão é total, Tudo o
que acontecer a partir de agora, será colocado na conta negativa dos Ministros.
Um onze avos para cada. Incluindo o relator, Teori Zavascki. Se ele
tivesse dado o brado retumbante na hora certa, nada teria acontecido.
Computa, computador, computa
O titulo
é do Millor, de 1980. Ele escreveu para condenar os que podem tudo, mas deliberadamente,
em certas circunstancias, fingem sair do centro dos acontecimentos. Homenageio
o gênio do Millor, e tento lembrar aos Ministros lances da sua própria
historia. Poderia citar fatos que ocorreram desde 1926. Numa constituinte
interna, ilegítima, mudaram e transformaram o Supremo.
Vou
contar apenas o episodio que envolve
também um vice.1955. Juscelino, eleito e reconhecido, teve a posse
contestada pela divisão de generais. Café Filho, que era vice desde a morte de
Vargas, não queria reconhecer a vitoria de JK, se ligou a alguns generais
golpistas.
Os
generais que defendiam o direito democrático do vitorioso, liderados por Lott e
Denys, garantiram a posse. O vice não se conformou. Depois de perder um Mandado
de Segurança, entrou com Habeas Corpus no Supremo. Sessão rigorosamente histórica.
Este repórter na primeira fila, sentado entre Milton Campos e Dario de Almeida
Magalhães. O relator, Nelson Hungria, começou a falar em pé, magnifico,
brilhante, magistral. Defendeu uma tese inteiramente subjetiva. Mas baseada e
lastreada na segurança e na tranquilidade nacional, se transformou em objetiva,
legitima, vitoriosa e aplaudida.
Qual a
tese defendida por Nelson Hungria e aprovada por unanimidade? Café Filho era um
conspirador mais do que notório, o país não teria paz. Ratificando Nereu Ramos,
eleito constitucionalmente pela Câmara na vacância dos cargos, passaria o poder
a JK, na data marcada. Juscelino viajou 1 mês na condição de
presidente
eleito e ainda não empossado. Voltou, tomou posse, governou os 5 anos do
mandato, passou o cargo ao sucessor.
O Supremo
ainda pode anular a tramitação e a votação do impeachment na Câmara, visivelmente
viciada, conspurcada e prostituída pela presença de Eduardo Cunha. E determinar
a prisão preventiva dele, sugerida nos votos dos Ministros Fachin e Gilmar
Mendes. Com essa anulação, o Senado não teria o que fazer hoje, terça e quarta.
E talvez o TSE acelerasse a inevitável cassação por corrupção da chapa Dilma -Temer.
O
"novo" presidente da Câmara
Os acólitos
e apaniguados do vice, gastaram as ultimas 72 horas na procura de um
presidenciável parlamentar. O vice afirmou publicamente, "não participarei
de coisa alguma, deixarei os partidos decidirem". Mistificação, igual ao
"ministério de notáveis", compromisso de modificar completamente os acontecimentos.
E para encurtar, o tão prometido "pais do futuro", que comandado por
ele, será apenas excrescência. Ou reminiscência dos últimos tempos, sempre com
a participação dele, naturalmente sem disputar eleição.
Dos 513 deputados, apenas 16 ou 20, podem pretender
a presidência
Parece
exagero. Mas enquanto Temer e outros poderosos do esquema, mantinham o corrupto
Eduardo Cunha, e se acumpliciavam para garantir objetivos escusos, este repórter
imaginava a sucessão de Cunha. Ficamos todos, de norte a sul, estarrecidos com
a declaração do vice Waldir Maranhão. Um jornalista fez uma pergunta.
Falou:
"Antes de responder, tenho que conversar com Deus". Não pretendo
desacreditar sua fé ou crença. Mas conversar com Deus em pleno expediente, é um
acinte, uma demonstração de primarismo, que o desacredita para qualquer função
publica ou representativa.
A partir
de 1945, fiz o meu primeiro trabalho parlamentar importante. Durante 7 meses e
18 dias, convivi com deputados e senadores, vi como se fazia uma Constituição. Conheci
deputados depois senadores,Ministros, governadores, até presidentes da Republica.
Nesses 70
anos, que contatos, que informantes, que participantes. Nas duas ultimas semanas, lembrei, relembrei, comparei. Que vergonha
destes políticos que inauguraram a politicalha. Na cidade mais bonita do
mundo, a mais emporcalhada usina de lixo, no Parlamento mais caro que se
conhece. Por causa disso, encontrei apenas 3 por cento, capaz de assumir, com
dignidade, credibilidade e capacidade, sua presidência.
PS- Desde
janeiro, Dona Dilma repete: não renunciarei. A partir de quinta feira, o refrão
vem do palácio presidencial de Eduardo Cunha:não renunciarei. Quem sabe
quando o terceiro personagem pronunciará as mesmas duas palavras. Se vierem, o
som será ouvido do Planalto ou do Jaburu?
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