GOVERNO
TEM DEVER MORAL E JURÍDICO DE RESISTIR AO BANDO QUE ASSALTA O PODER
*Jorge
Rubem Folena de Oliveira
O povo brasileiro, em sua maioria
expressiva, entendeu que existe um golpe de estado no Brasil, segundo as
últimas pesquisas de opinião.
O governo não foi derrubado
antes porque formou-se uma grande resistência popular, que tomou as ruas do
Brasil, com grandes comícios em quase todas as cidades, em eventos que
ocorreram até a semana da votação da abertura do processo de impeachment na
Câmara dos Deputados.
Aquele 17 de abril de 2016
talvez seja o dia mais negro da História do Brasil, pois foi quando a população
percebeu que os deputados, na sua quase totalidade, não têm nenhuma credibilidade
para o exercício da função e que, na verdade, compraram seus cargos mediante o dinheiro
investido em suas eleições.
O povo, que se posicionou
contra o golpe nas diversas reuniões ocorridas nos espaços públicos nestes
últimos meses no Brasil, manifestou-se por meio de uma grande frente em defesa da
democracia, reconquistada a partir de 1985, no arranjo político denominado de
“nova república”, num processo de transição ajustado com antigos atores
políticos que serviram fielmente a ditadura militar-civil (1964-195).
Muitos destes agentes
políticos civis ainda atuam livremente no país e, a partir de 12 de maio de
2016, assaltam o poder.
O assalto ao poder está
sendo executado por um bando sem credibilidade, composto por indivíduos que, em
sua maioria, respondem por crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, sonegação
fiscal e outros desmandos.
Desse bando também fazem
parte aqueles que, no passado recente de nossa jovem democracia, entregaram as
riquezas do país por meio da privatização de empresas públicas rentáveis e prósperas
e impuseram um manual de políticas nocivas aos trabalhadores e aos pobres do
país, seguindo à risca as orientações do Banco Mundial e do Fundo Monetário
Internacional.
Para esta gente, que tenta tomar
o poder a qualquer custo, o Brasil não é
para os brasileiros, mas sim para seus interesses particulares e para a
facilitação dos negócios, que, doravante, poderão realizar com grupos
empresariais estrangeiros, abrindo, de vez, “os portos” brasileiros.
A grande questão do momento
é a ausência de resistência da Presidenta Dilma Roussef, que, no discurso de 1.o
de maio, em São Paulo, declarou que iria lutar por seu governo e não se
entregaria aos golpistas.
Política se faz com luta e
resistência, utilizando-se de todas as armas possíveis. Dilma Roussef, neste
momento, conta com o apoio expressivo dos movimentos sociais organizados e, até
mesmo, dos desorganizados, que se colocaram à sua disposição para defender a
democracia no país, ocupando todos os espaços públicos possíveis.
Porém, a presidenta Dilma
(ao contrário do que manifestou) parece não querer resistir. Até a manhã de
12/05/2016 ela não veio a público para esclarecer que, mesmo tendo sido aberto
o processo de impeachment no Senado Federal, ela tem o direito de continuar no
Palácio do Planalto, nem determinou que seus ministros continuem na
titularidade de seus cargos, pois o país está diante de um golpe de estado; nem
manifestou que o vice-presidente não é o
presidente do Brasil, posto que continua sendo dela, que foi eleita pela
maioria do povo brasileira e cujo mandato lhe foi outorgado pela soberania
popular até o final de 2018.
Os que querem assaltar o poder
não têm voto, legitimidade nem credibilidade popular. Muitos são acusados de
corrupção, lavagem de dinheiro e sonegação fiscal. Sabemos que o vice-presidente (que não é
presidente) foi condenado pela Justiça Eleitoral e tornou-se o que a legislação
política brasileira denomina de político
“ficha suja”, e está proibido de concorrer a qualquer cargo público no país.
A preocupação que nos toma é
que Dilma Roussef possa ter sido mal orientada juridicamente por seus
assessores. O Advogado Geral da União
deixou para questionar judicialmente a validade da votação da abertura do
impeachment na Câmara dos Deputados (ocorrida em 17/04/2016) no dia 10 de maio
de 2016, um dia antes do Senado Federal
realizar a sua votação.
Pior de tudo, o Advogado
Geral da União propôs a ação errada e
fora do prazo, como constou no despacho do juiz relator do caso no Supremo
Tribunal Federal, Teori Zavascki, no mandado de segurança 34.193.
Para Teori, Cardozo (o
Advogado Geral da União, que não serviu para ser ministro da Justiça e foi
demitido do cargo) não poderia ter impetrado mandado de segurança – que exige
prova pré-constituída – e deveria ter ajuizado a ação no prazo de 120 dias, a
contar de 02/12/2015, data em que Eduardo Cunha aceitou o pedido de
processamento do impeachment, que era o ato atacado.
Independentemente deste
lamentável fato, que expôs a fraqueza da assessoria da presidenta, Dilma também
foi mal orientada ao não esclarecer por qual razão deveria demitir seus
ministros para que o vice-presidente possa assumir e nomear outros, até porque
ele não estará assumindo um novo governo, pois o governo eleito continua, e o
papel do vice é exercer, transitoriamente, o cargo, auxiliando o governo para
que Dilma possa se defender pessoalmente no Senado.
Não existe a hipótese
constitucional de se dar nova posse a um vice-presidente; sua posse é a mesma
que foi dada a Dilma Roussef em 1.º de janeiro de 2015, quando ambos juraram
cumprir a constituição e honrar o atual governo, eleito pela maioria do povo
brasileiro.
Inexiste na Constituição a
hipótese de destituição de um governo em razão da abertura do processo de
impeachment no Senado. Da mesma forma, a Constituição não estabelece que o vice (que não é presidente) possa
colocar em prática um plano de governo que não foi submetido à soberania popular
e que servirá apenas para atender aos interesses do mercado, com a imposição de
um ajuste fiscal e outras medidas restritivas, que serão muito amargas para
todos os trabalhadores, aí incluída a classe média e os funcionários públicos.
Os golpistas é que deveriam questionar,
judicialmente, a partir de hoje, a legalidade da ocupação do Palácio do
Planalto (o símbolo do exercício do poder presidencial) por Dilma, bem como o
prosseguimento de seu governo e a continuidade do exercício do cargo por seus
ministros.
Dilma necessita, mais do que
nunca, cumprir fielmente o que afirmou em seu discurso de resistência do dia
primeiro de maio e, assim, transferir para os
golpistas o ônus de tentar se apossar do Palácio do Planalto e do governo,
submetendo-se ao risco de propor as medidas jurídicas para a consolidação do golpe.
Por tudo isto, o golpe fica
mais claro do que nunca, na medida em que, de acordo com as regras do
garantismo constitucional, Dilma Roussef não deixou de ser a presidenta do
Brasil com a mera abertura do processo de impeachment no Senado! Dilma e seu
ministério estão amparados pelas normas constitucionais e pela legalidade.
Porém, tudo faz crer que o
Advogado Geral da União omitiu este fato da presidenta e da sua assessoria. É
um absurdo a orientação aos ministros para a entrega dos cargos e a desocupação
do Palácio do Planalto, quando a Constituição nada estabelece a este respeito.
Faltou luta, resistência,
coragem e competência da assessoria presidencial, que parece estar mais a
serviço daqueles que sonham com a entrega do país a um bando de oportunistas,
acusados judicialmente de corrupção, que almejam impor um governo sem qualquer
respaldo da soberania popular, imaginando que não haverá luta nem resistência
nas ruas do país.
Jorge
Rubem Folena de Oliveira - Cientista político
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