Titular: Helio Fernandes

segunda-feira, 13 de junho de 2016

“PLANO C DO GOLPE”: PROPOSTA DE NOVA ELEIÇÃO PRESIDENCIAL SEM CONVOCAÇAO DE ELEIÇOES GERAIS E DE CONSTITUINTE EXCLUSIVA

Jorge Rubem Folena de Oliveira

Antes de tudo, é importante esclarecer à opinião pública que os senhores congressistas não detêm autorização constitucional para reduzir ou limitar o mandato constitucional de um Presidente da República (eleito diretamente pelo povo para o exercício do cargo por quatro anos), convocando uma consulta popular, por meio de referendo ou plebiscito, conforme previsto no artigo 49, XV, da Constituição.

Caso isto ocorra sem a livre e exclusiva vontade da presidenta, os parlamentares estarão instituindo a figura do “recall” (revogação do mandato), não prevista na Constituição do Brasil, embora existente na República Bolivariana da Venezuela e em alguns estados americanos.

É importante ressaltar que a Presidenta Dilma se encontra sob constante coação dos parlamentares e, por isso, mesmo que haja aceitação de tal proposta, poderá estar caracterizado o vício em sua manifestação de vontade, que tornaria nulo o desequilibrado pacto político proposto.

Tal proposição constitui apenas mais uma tentativa de golpe, o “Plano C”, que se materializaria mediante a convocação de um plebiscito exclusivo para novas eleições presidenciais. Ressaltando-se que o “Plano A” foi a contratação do impeachment e o “Plano B” foi a tentativa de fazer emplacar o semipresidencialismo. Todos eles constituem hipóteses construídas para afastar Dilma Rousseff do seu mandado presidencial, com base em instrumentos falsamente democráticos.

A partir da entrevista que a presidenta Dilma Roussef concedeu ao jornalista Luís Nassif no dia 09 de junho de 2016, levada ao ar pela Rede Brasil (TV Pública), retomou-se, no dia 10 de junho, o “pacto da chantagem”. Qual seja, os senadores (muitos deles respondendo a processos criminais e, até mesmo, sob a ameaça de prisão - casos de Renan Calheiros, presidente do Senado, e de Romero Jucá, um dos articuladores do golpe, e todos do PMDB, como José Sarney e Eduardo Cunha) absolveriam a presidenta – que nenhum crime cometeu – do processo de impeachment, desde que ela convocasse um plebiscito para o povo decidir se deve ou não haver nova eleição presidencial.

Ora, isto é um desdobramento do golpe institucional e tem o objetivo de legitimá-lo, dando-lhe falsos ares de democracia participativa. Assim, o mandato de Dilma seria referendado, ou não, pelo povo, porém sob forte influência da propaganda negativa a ser promovida pelos meios de comunicação social, como tem ocorrido até então.

Recordo-me de que, em um lance de desespero, semelhante proposta foi apresentada em 28 de abril de 2016 (quatro dias antes das comemorações do dia do Trabalhador, em 1o de maio), numa reunião entre a presidenta Dilma,  o ex-presidente Lula, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e lideranças do movimento social.

Naquela oportunidade, Dilma – embora sob forte pressão e coação, não aceitou a proposta – que teria o suposto efeito de suspender a tramitação da abertura do processo de impeachment, que ainda seria votado no Senado, no dia 11 de maio de 2016.

Dilma Roussef – gostando ou não dela – foi eleita pela maioria absoluta dos eleitores brasileiros, para exercer um mandato de 1.o de janeiro de 2015 até 1.o de janeiro de 2019. Sacá-la do poder, por meio de um descabido impeachment (pois não cometeu qualquer crime que justifique um ato político tão extremado) ou por meio da proposta  oportunista e aventureira do encurtamento do seu mandato, ou seja, mediante a convocação de novas eleições presidenciais apenas, é jogar a democracia definitivamente “na lata do lixo”.

Como afirmou Dilma Rousseff na referida entrevista, o maior contrato firmado pelo povo de um país é a eleição direta. Não respeitar civilizadamente o resultado da eleição e manipular as instituições democráticas, como a oposição tem feito no Brasil desde 2014, inclusive com o auxílio de integrantes do poder judiciário (politização da justiça), tem como consequência mostrar ao mundo que inexiste segurança no país, seja para os nacionais ou para os estrangeiros que venham para cá viver ou comerciar.

Entendo que a atual crise política representa o fim da “Nova República”, fundada a partir de 1985 no pacto de redemocratização do Brasil, depois de vinte e um anos de ditadura militar-civil.

A redemocratização foi, sem dúvida, “tutelada” por homens do antigo regime ditatorial, que ainda hoje atuam livremente no poder político, pois o Brasil não realizou a purgação daquele período, mediante um processo de justiça de transição.

Tanto é assim que a Comissão Nacional da Verdade escreveu sua versão da história oficial sem ouvir importantes operadores civis do antigo regime, como José Sarney, Delfin Neto, Moreira Franco e muitos outros, que foram ministros de Estado, governadores, prefeitos, parlamentares, magistrados, promotores, professores, religiosos, jornalistas, empresários etc., que poderiam – numa inquirição profissional – revelar fatos do passado que poderiam nos ser úteis para a compreensão do momento presente, na instável vida política nacional.

Retomando o tema central, na referida entrevista a presidenta Dilma Rousseff deixou a impressão de que, na eventualidade de seu retorno ao Palácio do Planalto, a “concertação” parlamentar que vinha sendo mantida pelo apoio do PMDB, desde os primeiros governos da redemocratização, deixará de existir no país. Isto é, a posição oportunista e golpista das principais lideranças do PMDB impossibilitará ao partido servir de base de sustentação para o seu governo.
Assim, ao propor novas eleições, não significa que Dilma tenha colocado o seu mandato sob referendo popular, mas se traduz numa oportunidade para serem convocadas eleições gerais para todos os cargos (presidente, senadores, deputados federais, estaduais, prefeitos e vereadores), diante do grave desgaste dos políticos e de seus partidos, envolvidos diretamente em escândalos de corrupção e associação com o capital financeiro e empresarial, que se beneficiam das ações governamentais e parlamentares para favorecer os seus negócios privados.

Acredito que não se pode fazer uma audição ou leitura estreita da entrevista da presidenta, como almejam algumas lideranças parlamentares, que visam escapar das acusações de seus malfeitos criminais em troca da absolvição da presidente no processo de impeachment, condicionada à convocação de um referendo exclusivamente para o mandato dela, que constituiria um “recall”, instituto não previsto na Constituição brasileira.

Finalmente, entendo que o momento exige um pacto político entre todos os envolvidos e a sociedade, para que sejam referendados todos os mandatos de cargos eletivos (presidência da República, Senado, Deputados Federais, Governadores, Deputados Estaduais, Prefeitos e Vereadores), bem como a convocação de uma assembleia nacional constituinte exclusiva (sem a participação dos deputados e senadores eleitos), para elaborar uma reforma política que traga novas soluções institucionais, em conformidade com a realidade do país, e não copiadas de modelos empregados em outros países, os quais também atravessam semelhante crise de representatividade.
  
Jorge Rubem Folena de Oliveira  - Advogado constitucionalista e doutor em ciência política



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