“PLANO
C DO GOLPE”: PROPOSTA DE NOVA ELEIÇÃO PRESIDENCIAL SEM CONVOCAÇAO DE ELEIÇOES
GERAIS E DE CONSTITUINTE EXCLUSIVA
Jorge
Rubem Folena de Oliveira
Antes de tudo, é importante
esclarecer à opinião pública que os senhores congressistas não detêm
autorização constitucional para reduzir ou limitar o mandato constitucional de
um Presidente da República (eleito diretamente pelo povo para o exercício do
cargo por quatro anos), convocando uma
consulta popular, por meio de referendo ou plebiscito, conforme previsto no
artigo 49, XV, da Constituição.
Caso isto ocorra sem a livre
e exclusiva vontade da presidenta, os parlamentares estarão instituindo a
figura do “recall” (revogação do mandato), não prevista na Constituição do
Brasil, embora existente na República Bolivariana da Venezuela e em alguns
estados americanos.
É importante ressaltar que a
Presidenta Dilma se encontra sob constante coação dos parlamentares e, por
isso, mesmo que haja aceitação de tal proposta, poderá estar caracterizado o
vício em sua manifestação de vontade, que tornaria nulo o desequilibrado pacto
político proposto.
Tal proposição constitui apenas
mais uma tentativa de golpe, o “Plano C”,
que se materializaria mediante a convocação de um plebiscito exclusivo para
novas eleições presidenciais. Ressaltando-se que o “Plano A” foi a contratação
do impeachment e o “Plano B” foi a tentativa de fazer emplacar o
semipresidencialismo. Todos eles constituem hipóteses construídas para afastar
Dilma Rousseff do seu mandado presidencial, com base em instrumentos falsamente
democráticos.
A partir da entrevista que a
presidenta Dilma Roussef concedeu ao jornalista Luís Nassif no dia 09 de junho
de 2016, levada ao ar pela Rede Brasil (TV Pública), retomou-se, no dia 10 de
junho, o “pacto da chantagem”. Qual
seja, os senadores (muitos deles respondendo a processos criminais e, até mesmo,
sob a ameaça de prisão - casos de Renan Calheiros, presidente do Senado, e de
Romero Jucá, um dos articuladores do golpe, e todos do PMDB, como José Sarney e
Eduardo Cunha) absolveriam a presidenta – que nenhum crime cometeu – do
processo de impeachment, desde que ela convocasse
um plebiscito para o povo decidir se deve ou não haver nova eleição
presidencial.
Ora, isto é um desdobramento
do golpe institucional e tem o objetivo de legitimá-lo, dando-lhe falsos ares
de democracia participativa. Assim, o mandato de Dilma seria referendado, ou
não, pelo povo, porém sob forte
influência da propaganda negativa a ser promovida pelos meios de comunicação
social, como tem ocorrido até então.
Recordo-me de que, em um
lance de desespero, semelhante proposta foi apresentada em 28 de abril de 2016 (quatro
dias antes das comemorações do dia do Trabalhador, em 1o de maio),
numa reunião entre a presidenta Dilma, o
ex-presidente Lula, o presidente do Senado, Renan Calheiros, e lideranças do
movimento social.
Naquela oportunidade, Dilma
– embora sob forte pressão e coação, não aceitou a proposta – que teria o suposto
efeito de suspender a tramitação da abertura do processo de impeachment, que
ainda seria votado no Senado, no dia 11 de maio de 2016.
Dilma Roussef – gostando ou
não dela – foi eleita pela maioria absoluta dos eleitores brasileiros, para exercer um mandato de 1.o
de janeiro de 2015 até 1.o de janeiro de 2019. Sacá-la do poder,
por meio de um descabido impeachment (pois não cometeu qualquer crime que
justifique um ato político tão extremado) ou por meio da proposta oportunista e aventureira do encurtamento do
seu mandato, ou seja, mediante a convocação de novas eleições presidenciais
apenas, é jogar a democracia definitivamente “na lata do lixo”.
Como afirmou Dilma Rousseff na
referida entrevista, o maior contrato firmado pelo povo de um país é a eleição
direta. Não respeitar civilizadamente o resultado da eleição e manipular as
instituições democráticas, como a oposição tem feito no Brasil desde 2014,
inclusive com o auxílio de integrantes do poder judiciário (politização da
justiça), tem como consequência mostrar ao mundo que inexiste segurança no
país, seja para os nacionais ou para os estrangeiros que venham para cá viver
ou comerciar.
Entendo que a atual crise
política representa o fim da “Nova República”, fundada a partir de 1985 no
pacto de redemocratização do Brasil, depois de vinte e um anos de ditadura
militar-civil.
A redemocratização foi, sem
dúvida, “tutelada” por homens do antigo regime ditatorial, que ainda hoje atuam
livremente no poder político, pois o
Brasil não realizou a purgação daquele período, mediante um processo de
justiça de transição.
Tanto é assim que a Comissão
Nacional da Verdade escreveu sua versão da história oficial sem ouvir
importantes operadores civis do antigo regime, como José Sarney, Delfin Neto,
Moreira Franco e muitos outros, que foram ministros de Estado, governadores,
prefeitos, parlamentares, magistrados, promotores, professores, religiosos,
jornalistas, empresários etc., que poderiam – numa inquirição profissional –
revelar fatos do passado que poderiam nos ser úteis para a compreensão do
momento presente, na instável vida política nacional.
Retomando o tema central, na
referida entrevista a presidenta Dilma Rousseff deixou a impressão de que, na
eventualidade de seu retorno ao Palácio do Planalto, a “concertação”
parlamentar que vinha sendo mantida pelo apoio do PMDB, desde os primeiros
governos da redemocratização, deixará de existir no país. Isto é, a posição
oportunista e golpista das principais lideranças do PMDB impossibilitará ao
partido servir de base de sustentação para o seu governo.
Assim, ao propor novas eleições, não significa que Dilma tenha colocado o seu
mandato sob referendo popular, mas
se traduz numa oportunidade para serem convocadas eleições gerais para todos os
cargos (presidente, senadores, deputados federais, estaduais, prefeitos e
vereadores), diante do grave desgaste dos políticos e de seus partidos,
envolvidos diretamente em escândalos de corrupção e associação com o capital financeiro
e empresarial, que se beneficiam das ações governamentais e parlamentares para
favorecer os seus negócios privados.
Acredito que não se pode
fazer uma audição ou leitura estreita da entrevista da presidenta, como almejam
algumas lideranças parlamentares, que visam escapar das acusações de seus
malfeitos criminais em troca da absolvição da presidente no processo de
impeachment, condicionada à convocação de um referendo exclusivamente para o
mandato dela, que constituiria um “recall”, instituto não previsto na Constituição
brasileira.
Finalmente, entendo que o momento exige um pacto político entre
todos os envolvidos e a sociedade, para que sejam referendados todos os mandatos
de cargos eletivos (presidência da República, Senado, Deputados Federais,
Governadores, Deputados Estaduais, Prefeitos e Vereadores), bem como a convocação de uma assembleia nacional constituinte
exclusiva (sem a participação dos deputados e senadores eleitos), para
elaborar uma reforma política que traga novas soluções institucionais, em
conformidade com a realidade do país, e não copiadas de modelos empregados em
outros países, os quais também atravessam semelhante crise de
representatividade.
Jorge Rubem Folena de
Oliveira - Advogado constitucionalista e
doutor em ciência política
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