O lúcido, autêntico e desassombrado histórico da
ditadura, aula e lição para o lamentável e melancólico trabalho da chamada
Comissão da verdade
HELIO FERNANDES
Elio Gaspari levou pouco mais de 20 anos para desenterrar e expor
negativamente, a historia nefasta, tenebrosa e criminosa da ditadura dos
generais. Poderia ter utilizado apenas 5 anos. São 5 livros, um por ano. Vou
nominá-los,para meu prazer e satisfação dos que vão comprá-los e se
deliciar.Com títulos elucidativos, inesquecíveis e definitivos.
Todos eles verdadeiros "achados" jornalísticos, roteiro seguro
para o trabalho incansável, com inicio, meio e fim. Em cada um deles a palavra
ditadura, para que ninguém esquecesse o que se tratava. Os milhares que
sofreram e morreram. Os milhões obrigados a viver sem liberdade.
No
primeiro identifica o golpe como ditadura "envergonhada". Era a
tentativa de se mostrar patriota e desprendida. Justificam a saída ás ruas, como
grandeza. E espalham sem constrangimento: "Estamos salvando o Brasil do
comunismo". Era puro carreirismo e a ambição pelo poder. Para reforçar a
mistificação, apregoam que se "sacrificam" por Deus, pela Pátria e
pela família.
Era o
começo. Mas durante os 21 anos em que dominaram o país, só foram se
deteriorando, se desmascarando, se desgastando em nome da pratica da tortura e
da selvageria. Sobre esse volume (e o segundo) escrevi no jornal impresso. “Deixei
claro, é 'verdadeiro' até no titulo:” A ditadura encurralada".
"A
ditadura escancarada", é talvez o mais corajoso e grandioso. È um
flagrante do momento exato em que abandonam a farsa da "revolução", assumem
o que não deixou de ser desde o inicio: "golpe". È o apogeu da
tortura e da repressão, martirizam selvagemente simples militantes. E
assassinam covardemente 60 guerrilheiros, utilizando 60 mil homens. Revivem, 70
anos depois, a mesma barbaridade praticada em Canudos. Liquidaram toda a
população da cidade. Só um homem foi salvo, fugiu, meses depois chegou ao Rio.
Não tendo onde morar, fundou a Favela da Providencia, se entrava pela aristocrática
Rua do Ouvidor.
"A
ditadura derrotada", é o encontro de contas do repórter-historiador com os
principais informantes, os generais-torturadores. Desde o primeiro livro não
esconde que Golbery e Geisel foram os maiores informantes. No desenvolvimento
das historias, não salva nem justifica nenhum dos dois.
Respeita
apenas o capitão Heitor Aquino Ferreira, que lhe forneceu quilômetros ou
montanhas de documentos. Sem a sua participação, teria apenas o resultado de
pesquisas, verdadeiras, exaustivas, distantes, podendo ser contestadas. Gaspari,
obrigado por circunstancias familiares há morar um tempo longo nos EUA, os
documentos do capitão prodigiosos.
Golbery e
Geisel, são altamente vulneráveis. Autor de varias tentativas de golpe, Golbery
perdeu todas. Em1961, ainda na ativa, foi o artífice da renuncia de Janio, o
objetivo era manter o trêfego e bêbado presidente, "com plenos e irrevogáveis
poderes".
Derrotado,
passou para a reserva. Era Tenente-Coronel, naquela época havia o privilegio
vergonhoso de ser promovido dois postos acima. Ficou, agiu e atuou no golpe de
64, sendo general. Mais tarde, com medo de Costa e Silva, foi nomeado Ministro
do Tribunal de Contas. Presidente da Dow Chemical, viveu luxuosamente até
morrer, numa chácara de Brasília. Não participou nem aceitava tortura.
Geisel
era totalmente diferente. Sabia das torturas dilacerantes da capitania Médici, não tomou providencias,aceitava tudo,
queria mesmo chegar à presidente. Combateu apenas a "eleição" de
Costa e Silva. Quando constatou ser impossível impedi-lo, era General de
Divisão, foi promovido a Exercito, e 15 dias depois nomeado Ministro vitalício
do STM. Quando Costa e Silva teve o AVC, e foi retirado do poder, ele e
Golbery, passaram logo para a reserva, voltaram á ativa na política. Indicado
como sucessor de Médici, este tinha restrições
por causa
da ligação de Geisel com Golbery.
Médici
pediu um encontro pessoal e reservado com Geisel, perguntou diretamente: "Quais
são as suas relações com o general Golbery?". Geisel, sem hesitação: "Não
o vejo ha anos, acho que está no Tribunal de Cotas". Se falavam
diariamente. Golbery foi o homem mais influente no governo Geisel.
Quando
houve o covarde assassinato do jornalista Vladimir Herzog, o
"presidente" Geisel inesperadamente demitiu o comandante do Segundo
Exercito, por dois motivos. Precisava se reabilitar pessoalmente. E era
pressionado fortemente pelo General Golbery. Que detestava tortura, e era
inimigo do general comandante do Segundo Exercito, Ednardo Davila Mello.
Conforme
expliquei, ainda não li o ultimo livro intitulado, "A ditadura encurralada".
Mas não ha duvida que tem a mesma grandeza dos outros. De todas as ditaduras
brasileiras, a partir da que começou em 1889 e foi até 1930, (41 anos da farsa
e falsa democracia do Partido Republicano) a de 64, a única a ser devassada,
desmemoriada, destroçada. Pela sua própria analise. E isso se deve unicamente
ao repórter-historiador, Elio Gaspari.
O
trabalho dele, inteiramente diferente do que foi feito com o nome mentiroso de
"comissão da verdade". Parcial, omissa, imprudente, em relação aos
maiores criminosos, os que usavam fardas cheias de estrelas e bordados. Empolgados
pelo exibicionismo, só se interessavam por eles mesmos. Os generais
torturadores eram apenas personagens para que pudessem transitar pelas
manchetes. "Validaram" a anistia ampla, geral e irrestrita.
Pedro Parente acertou em cheio
Antes da
posse fez duas afirmações que estranhei e registrei aqui. Pedi que tivesse
cuidado, o cargo que estava assumindo era importante demais. No final de
semana, colocou a empresa que está presidindo em duas posições, que devem ser
invioláveis. A primeira: "A Petrobras não será privatizada". Alivio
geral. A segunda: "O pré-sal será explorado exclusivamente pela
Petrobras". Aplausos de todos os lados. Essas convicções e a certeza de
que não rouba nem deixa roubar, levam a uma conclusão: o próximo roteiro da
Petrobras, irá percorrer o caminho da recuperação.
Sergio Machado e as mil e uma
noites financeiras
Foi um
perdulário presidente da Transpetro. E um generoso distribuidor de dinheiro
para a cúpula do PMDB. Apesar de ter pertencido por 10 anos ao PSDB de
Jereissatti. Gravou 8 senadores com os quais tinha a maior intimidade. Confessou
que a três deles doou dinheiro. 30 milhões a Renan. 20 a Jucá. 20 a Sarney. Falou
que "abasteceu contas de Jader Barbalho e Edson Lobão". Mas não disse
quanto, nem se foram gravados.
Tem tanto
amor á liberdade, que em nome dela e como garantia da delação, se comprometeu. Devolverá100
milhões. E o filho, outros 40. Imaginem quanto sobrará. Angustia e ansiedade no
Senado. Ele não dá o nome dos 5 que afirma ter gravado. Alguns desconfiam, "ele
esteve na minha casa". Nenhuma certeza. Acreditam que podem ficar "para
depois", num indispensável reforço para a delação. O que só aumenta o medo
do que pode acontece. E quando. Garantem
que dos 5 gravados mas não identificados, um seria Edson Lobão. Nenhuma
surpresa.
O Brasil não ganha em Pasadena
A
primeira grande derrota foi à escandalosa compra da refinaria que tinha o nome
da cidade. Custou uma fabula de dinheiro, continua dando prejuízo até hoje. Mas
trouxe um extraordinário beneficio: a criação da Lava-Jato. Que está levando
muita gente para a cadeia. E ainda levará muito mais. Na madrugada de ontem,
novamente Pasadena entra na historia brasileira. Agora de forma dita esportiva.
Numa "pelada" indescritível e insuportável, começou zero a zero e
terminou exatamente igual. Se pelo menos trouxer a demissão de Dunga.
Esqueceram de convidar Dilma, Cerveró, Gerdau, todo o Conselho da Petrobras da
época.
Amanhã: terça feira histórica e inesquecível
Dois
fatos importantíssimos, poderão ter solução amanhã. Na Comissão da falta de Ética,
quase completando 6 meses, votação da autorização para a admissibilidade da cassação
do negregado e corruptíssimo Eduardo Cunha. Ele vem tumultuando, manobrando e
atropelando os trabalhos, desavergonhadamente. A Comissão tem 21 membros, o placar mudou
varias vezes. Agora está 10 a 9 a favor dele. E uma deputada com voto ainda não
publicamente declarado. Mas afirmou: "Votarei pela moralidade da Câmara".
Se
cumprir o que diz, o resultado será de 10 a 10, o presidente desempatará contra
o ex-presidente da Câmara. Que será fulminado pelo plenário, em voto aberto. A
outra decisão de amanhã: a resposta do Presidente do Supremo, Lewandowski.Terá
que decidir sobre o pedido (exigência) dos golpistas,que pretendem acabar com o
julgamento, dizimando e acelerando os prazos. O Supremo não pode coonestar e
concordar com a pretensão dos golpistas.
O Supremo fulmina Temer
Um dos
primeiros atos do presidente provisório, foi demitir o presidente da EBC. (Empresa
Brasileira de Comunicação). Não quis examinar se podia ou não podia praticar o
ato. O demitido entrou no supremo, ganhou, voltou ao cargo no mesmo dia. Tinha
contrato de 4 anos com a empresa. Que foi criada legal e constitucional.
Conselhos e diretorias, tudo perfeito. Temer, insensata, impensada e
irresponsavelmente, fez o que não tinha poder para fazer. Diante do massacre,
colocou a culpa no Advogado Geral da União. Que está na lista e na linha de ser
demitido "a pedido".
Temer
deveria ter agido de outra maneira: estudando a forma de acabar com essa EBC, inútil,
dispendiosa, ruinosa, sem objetivos. Quando soube que iam fundar essa televisão
estatal, telefonei para o jornalista que me apontaram como "o idealizador
e entusiasta do projeto". Não sou amigo dele, fui amigo do pai, grande
figura. Foi candidato a senador pelo MDB, em 1966,quando fui cassado.
Queria
prestar um serviço. O jornalista me disse: "Vamos fazer a BBC no Brasil".
Respondi: "A BBC tem audiência e independência". E acrescentei: "O
Primeiro Ministro fica furioso com algumas matérias, não pode fazer nada".
A EBC é um fracasso completo. Com prejuízo que já ultrapassa a casa dos
bilhões. Acima dos 2 dígitos.
PS- Mouhammed
Ali foi lenda, símbolo, ícone, mito e legenda, dentro e fora dos ringues. Com
22 anos, conquistou a faixa de campeão mundial de boxe pela primeira vez. Só
não foi o mais moço de toda a historia, porque 2 anos antes, com 20 anos, Mike
Tyson saiu direto do reformatório para a gloria e o titulo.
PS2- Não
pela própria vontade, 2 anos depois, com 24 anos, saiu dos ringues para
enfrentar e surpreender o mundo. Convocado para lutar na guerra do Vietnã,
recusou, com personalidade, garra e convicção, afirmou: "Não conheço
ninguém lá, não vou matá-los, nunca me fizeram mal".
PS3-Preso,
com o titulo mundial retirado, proibido de lutar boxe, enveredou por outros
tipos de combate. Depois de 3 anos, a decisão da Suprema Corte. Absolvido, com
o titulo mundial devolvido, voltou aos ringues, mas descobrira que não devia
lutar apenas por si e para si. Havia a humanidade inteira, decidiu não abandoná-la.
PS4- Transfomou
–se num campeão pela paz. Compreendeu que só existiam duas guerras dignas de
serem combatidas: contra a desigualdade racial e a desigualdade social. Herói
das duas, ídolo do mundo inteiro, do povo das ruas e das maiores
personalidades. Que se manifestaram ontem, sofridamente, assim que souberam de
sua morte. Nunca vi um obituário tão imediato, movimentando multidões.
PS5-Continuou
as duas vidas. No ringue, foi campeão mundial três vezes. Fora dele não parou
de combater o bom combate. Quando completou 40 anos, sentiu o primeiro sinal do
Parkson. Que foi aumentando cruelmente nos 34 anos seguintes. Na Olimpíada de Atlanta,
emocionou multidões. Inesperadamente pegou a tocha Olímpica. Trôpego e quase se
arrastando, demonstrou toda a sua vitalidade interna. Com ela, tentava carregar
a tocha. Que emoção.
PS6- Nessa
ocasião, muitos choraram, não de pena mas de orgulho. O mesmo que aconteceu
ontem, transmitido pelos mais diversos órgãos de comunicação. De uma certa
maneira, o destino foi injusto e ingrato com Ali. Mas como seu enterro só acontecerá
na quinta feira, haverá um espaço de tempo para saudades. E lembranças que
nunca serão esquecidas.
PS7- O
Itamaraty vibrou com a nota oficial, assinada pelo Ministro Serra, lamentando a
morte de Mourrammed Ali. Diplomatas acharam que Serra humanizou o ministério.
PS8- Ao
contrario, perplexidade geral, com a nota oficial do presidente provisório,
sobre a morte do coronel Passarinho. Chamado de "grande brasileiro". No primeiro
dia do golpe de 64, servia no Pará como major. Invadiu o palácio, se fez
"governador". Em 1968, Costa e Silva hesitava sobre o tenebroso A-5. Passarinho convenceu-o com as
palavras: "Às favas, presidente, os escrúpulos e a consciência"
PS9- televisões, ontem, lembraram o inacreditável
AI-5. Mas deviam decretar luto cívico pela irresponsável nota oficial de
MichelTemer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário