Titular: Helio Fernandes

sábado, 18 de julho de 2015

HELIO FERNANDES
Matéria publicada em 30.12.14

31 de março e 1º de abril, trato do golpe de 64 com lembranças do passado, e análises lúcidas de personagens de hoje. Começo citando como está no título, a afirmação do general Leônidas. Quando ele diz que o “Exército nunca foi INTRUSO”, quer dizer que sempre esteve no primeiro plano de tudo, raramente deixou de ser participante e dominante.

Acontece que escrevo isso há mais de 30 ou 40 anos, citando a participação do Exército na República. Sempre estabeleci a diferença entre duas palavras: PROMULGAÇÃO e IMPLANTAÇÃO da República. A primeira palavra define ou definiria o movimento histórico dos “ABOLICIONISTAS”, e os “PROPAGANDISTAS da República”.

A segunda, intromissão de dois marechais, que entraram na História através de um golpe, (o primeiro da República), e tomaram o Poder. Cambaleando e quase sem conseguir subir num cavalo.

Não vou relembrar a História do Brasil, apenas confirmar o general

Deodoro e Floriano, dois coronéis que vieram brigados da estranha guerra do Paraguai, na madrugada de 15 de novembro, já marechais, se reconciliaram e “expulsaram” os civis da conquista da República. República que com esses dois Marechais, se transformou numa quartelada. Eu sei, o general Leônidas não havia nascido.

E também não era torturador. Mas numa entrevista ao repórter Geneton Moraes Neto, tentou convencê-lo de que “comandou o DOI-CODI”. Ora, o general Leônidas nem sabia onde ficava a Rua Barão de Mesquita. Adido Militar na Colômbia, se perdia no Rio.

O Exército ou generais sempre arrogantes  

Logo depois da República, massacraram e assassinaram toda a população de Canudos. Em 1896 usaram três quartas partes do efetivo militar, usando até canhões. Assassinaram toda a população, não escapou nem o “santo” Antônio Conselheiro.

Como “Tenentes” tumultuaram o país desde 1922, tomaram o poder em 1930. Garantiram a tremenda ditadura do Estado Novo. Ainda tiveram “fôlego” para derrubar João Goulart, que como eu já disse há anos, não tinha nada a ver com os comunistas. Queria o “poder total” e mais nada.

Tenho todo o direito de situar Jango na sua exata posição, pois em 1963, fui o único preso por ordem direta dele. Pediram 15 anos de prisão para mim, estavam certos de que me condenariam. Pois foi na minha casa que nasceu a “Frente Ampla”. Na minha casa e da minha cabeça.

Depoimentos históricos

Anteontem, na mesma página, matérias de agora, altamente elucidativas, competentes inesquecíveis. Numa entrevista ao repórter Bernardo Mello Franco, Daniel Aarão Reis, lúcido e participante, com a visão do torturado agora Historiador, interpreta o golpe dos dois lados. E em com total isenção ou não poderia ser chamado de Historiador.

Aarão Reis, que começou na guerrilha com 23 anos, freqüentou os subterrâneos da ditadura. Foi torturadíssimo até ser trocado pelo embaixador alemão, seqüestrado precisamente para haver a negociação. E a ditadura dos generais torturadores, mostrou mais uma vez a covardia inata e assumida.

Cumpriram as ordens dos EUA

Assim que o embaixador americano foi seqüestrado, (decisão, planejamento e execução perfeita), começaram as conversas. Primeiro exigiram a leitura, nas televisões, do manifesto dos seqüestradores. Veio a ordem: “Publiquem imediatamente”. Publicaram, lógico.

A seguir a exigência da troca do embaixador por alguns presos. Os combatentes ainda não tinham consciência da própria força, “trocaram” por poucos. Mais tarde, com o seqüestro do insignificante embaixador alemão. 39 presos foram soltos ou embarcados para o exterior.

O final da entrevista de Aarão Reis, dois pontos magistrais. 1 – “Faltou povo na guerrilha”. É verdade. Mas como 60 guerrilheiros poderiam passar por cima de 60 mil militares? Que recebiam ordens de alguns generais ambiciosos?

2 – Deixa à mostra a “contradição” de alguns generais e não do Exército: “Até hoje esses generais se omitem, condenam e falsificam a história”.

E de forma irresponsável: “Fui preso, torturado, anistiado pelo Ministério da Justiça. E quem me torturou diz que não houve tortura no Brasil”. E ele mesmo termina: “É uma coisa esquizofrênica”.

Demétrio Magnoli não tinha idade para combater, tem para analisar

Sociólogo, Geógrafo, com vocação de historiador, conta e interpreta fatos importantes. Contesta os “memorialistas das conveniências”, e corajosamente penetra num círculo que tantos querem esquecer. Círculo da contradição, digo eu.

“O golpe de 64 não nos salvou da ameaça comunista que não existia”. E depois: “Isso foi urdido por um fascismo puramente imaginário”. O artigo de Demétrio vai assim até o final, é um dos dois pontos mais completos e para ser aplaudido.

O segundo é a coragem e o discernimento de entrar na interpretação de um dos fatos mais importantes do golpe. Os dois editoriais do Correio da Manhã, intitulados “Basta” e “Fora”. Até hoje se discute, se nega e se confirma a autoria dos manifestos.

Demétrio dá o nome de sete autores, desculpe, foram oito. Hoje todos negando a autoria, com exceção de quatro que já morreram. Esses dois artigos explicitam e elucidam um período torpe, covarde e farsante da História do Brasil.

O primeiro golpe militar foi o da República. Dois marechais que eram inimigos, se reconciliaram, derrotaram a brilhante geração dos “abolicionistas” e dos “propagandistas da República”. Os charmosos “Tenentes de 1922”, combateram até 1930, quando se beneficiaram de tudo.

O Estado Novo, garantido pelos generais

Em 1937, Vargas “implantou” ditadura, que chamou de “Estado Novo”. Garantido pelo general Dutra, que nos oito anos, foi chamado de “condestável do Estado Novo”. Derrubada a ditadura, lógico foi presidente, garantindo a volta de Vargas.

O golpe de 64, teve remanescentes

Alguns mais longevos, que palavra, garantiram o Estado Novo, voltaram em 64. Que capacidade. Concluiu, dizendo: “Vamos olhar para o futuro, esquecendo o passado”. Que farsa, Ministro. Era melhor ficar em silêncio. A Comissão da Verdade deveria ter sido criada 33 anos antes e não agora.

Mas sem interpretar e examinar o passado, não podemos acreditar no futuro. O passado, qualquer que seja ele, tem que ser lembrado, mesmo para ser contestado. Quando assinaram em 1979 a extravagante “anistia ampla, geral e irrestrita”, estavam tentando sepultar esse passado.

Os próprios militares que deram o golpe de hoje, estavam apavorados e achavam que com esse “ato” que só beneficiou os vencedores, não valia nada, sendo assinado apenas pelos representantes de um lado. E que estavam absolvendo a eles mesmos.
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