A Carta Del Lavoro e o principio “pro misero”?
(...) É inegável que existe uma enorme distância entre o juiz,
os demandantes e seus patronos. Tendo como notícia de que 105 milhões de ações
abarrotam dos tribunais do país, não é difícil avaliar que a morosidade, por
mais que se façam novas leis e criem exigências, não será estancada. A forte
demanda, advinda das anomalias das relações da sociedade, deságua no judiciário
brasileiro, apegado a uma cultura do litígio.
ROBERTO MONTEIRO PINHO
A justiça trabalhista nasceu
tal qual a "vitória régia" ornamenta nossos pântanos, inspirando o
mais brando e límpido sentimento de pacificação, tendo como âmago, à mediação
das relações trabalho/capital, regulando leis e normas, cujo objetivo é a
primazia do direito (a mais valia), sem que nenhum deles nunca mais fosse
aviltado.
Aqui alavancada pelos tribunais
rurais na “década de 30’, a especializada ganhou corpo, não por competência dos
seus integrantes, mas pela necessidade de ser a resposta aos conflitos da
Segunda Guerra Mundial, onde o globo, em todo seu maior plano ideológico,
econômico e social, tinha compulsoriamente os "olhos" voltados para
as necessidades de sobrevivência da humanidade.
O papel desta justiça
especializada foi até a década de 90, primordial para proteger e dar suporte a
libertação do julgo de poucos contra muitos. O desmanche serviu para uma elite
de julgadores apoderarem de todo seu arcabouço, tendo como objetivo o
corporativismo. Findada a Segunda Guerra, a era da reconstrução, trouxe uma nova
mensagem ao planeta – a luta por interesses econômicos e ao mesmo tempo o
sentimento de libertação.
A globalização é uma revolução
em marcha. O capital voraz destrói tudo e a todos. A livre concorrência de
mercado, a automatização dos serviços, vem ceifando postos de trabalho. A “Era
Industrial” ao contrário de gerar mais empregos, passou a ser uma ameaça a
sobrevivência do trabalhador. O "principio do pro mísero", tão
aclamado pelos historiadores e juristas, foi ceifado sem piedade por aqueles
que se antagonizam a extrema necessidade de dar o suporte (garantia) do salário
digno, do cumprimento das regras de trabalho e da remuneração capaz de
alimentá-lo.
Em meio a discursos políticos,
das manifestações dos sindicatos e das propostas nada alvissareiras dos atores
internos da especializada, o fenômeno de justiça igualitária, cedeu espaço para
a tecnocracia jurídica, um pandemônio judicializado pilotado por julgadores
exibicionistas, figuras ridículas diante de um contexto, onde o "pro
misero", não consegue mais entrar em sua casa, para buscar seu direito,
se, por exemplo: este trabalhador não estiver “calçando um sapato, ao contrário
de um chinelo de dedos”, cuja notícia de ser barrado na audiência, causou
indignação pública. Atitude hostil e vetusta de um juiz especializado, que se
acha cima de toda essência do trabalhismo.
A norma processual civil,
em seu art. 125, IV, determina, com força cogente: “O juiz dirigirá o processo
conforme as disposições deste Código, competindo-lhe: IV- tentar, a qualquer
tempo, conciliar as partes."
Alimentam
os próprios juízes e uma minoritária corrente de juristas, que o papel da
magistratura mudará, principalmente pela linha processual conciliadora e de
cooperação que será adotada com o novo Código de Processo Civil. Para eles os
magistrados passam a ser parte do processo e deverão cooperar sempre que for
possível ou necessário. “O juiz é sujeito do processo e as convenções
processuais devem ser combinadas com ele.” Um dos
exemplos apresentados foi o artigo 191 do novo Código, que permite às partes e
ao juiz fixar o calendário processual desde que haja comum acordo.
Tudo como
se nunca houvesse a exigência de conciliação nas audiências de primeira e
segunda instância. Olvidam esses senhores da judicialização de que a vetusta
Lei da Magistratura (Loman), não contempla o juiz que faz acordos para contar
pontos no momento de sua
É inegável que existe uma enorme distância
entre o juiz, os demandantes e seus patronos. Tendo como notícia de que 105
milhões de ações abarrotam dos tribunais do país, não é difícil avaliar que a
morosidade, por mais que se façam novas leis e criem exigências, não será estancada.
A forte demanda, advinda das anomalias das
relações da sociedade, deságua no judiciário brasileiro, apegado a uma cultura
do litígio. Nenhum outro país do planeta existe um número tão elevado de ações,
ao contrário são pouquíssimas as demandas, e as leis são severas, e também não
temos tribunais e juízes com a arrogância e ausência do bona iuvant.
Durante uma década (1990 a 2000), juristas e
técnicos da área judiciária, defenderam que a reforma do Poder Judiciário
deveria começar pela abertura das portas dos seus palácios aos cidadãos. Abrir
no sentido mais exato da palavra, a começar com o seu funcionamento nos três
expedientes, aos sábados e aos domingos.
Em se tratando da justiça laboral, isso seria
fundamental, mas não é isso que vemos, ao contrário, o tempo dedicado a sua
função, faz do juiz brasileiro um dos maiores privilegiados do planeta. Pouco
tempo dedicado a atividade, e por isso, a morosidade e acúmulo de processos são
conseqüentes.
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