Morosidade e o livre
convencimento do juiz
(...) “O CPC/2015 não excluiu o julgador, tolhendo qualquer
espaço de liberdade decisória. Além da autonomia na valoração motivada da
prova, mesmo em matéria de interpretação do Direito há espaço para a liberdade de
convicção.”
ROBERTO MONTEIRO PINHO
No
CPC/2015 não temos dispositivo na esteira com o art. 131 do CPC/1973, o que tem
levado alguns intérpretes da Lei 13.105/2015 entender que não mais existe no
Brasil o princípio do livre convencimento motivado. O que vem a ser um
equívoco, se deixar levar pela ausência do diploma. No mais é de se apreciar,
que “o livre convencimento”, é parte integrante do arcabouço jurídico, cabendo
ao julgador, data venia, lançar mão
da espontânea dicção legal, sem prejuízo da segurança jurídica.
Em
que pese o “livre convencimento” na fase de instrução, a luz da presença das
partes, creio ser temerário, o livre convencimento fora deste cenário. Um dos
exemplos está na execução, já que no art. 831 do
Novo CPC, “a penhora deverá recair sobre tantos bens quantos bastem para o
pagamento do principal atualizado, dos juros, das custas e dos honorários
advocatícios” e, deve seguir a ordem de preferência, estando o
“dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição
financeira” a frente dos demais bens, tal qual previsto no art. 835.
O
“livre convencimento” pode se tornar uma arma diabólica para a credibilidade do
judiciário (que já não é das melhores). O Órgão Especial do TJ/SP decidiu há
pouco instaurar processo administrativo disciplinar contra a juíza Juliana
Nobre Correia, da 2ª vara do JEC Central de SP.
Alvo
de duas representações, a magistrada foi acusada de extinguir processos sem
análise de mérito de maneira reiterada e sistemática. Após a realização de
apuração e análise, o corregedor geral constatou que as ações mostram um
comportamento direcionado à negativa de jurisdição. Em outras palavras:
"negar a essência da função que nós exercemos como magistrados".
Trocando em números: de 938 sentenças que extinguiram o processo – analisadas
durante determinado período –, 302, ou 1/3, fundamentaram-se no art. 51, III,
da lei 9.099/95. Explicou.
A
bem da verdade o Judiciário é um poder verticalizado, em que as instâncias
inferiores devem, como regra, aplicar a lei tal como interpretada pelas cortes
superiores (vide arts. 103-A da CF e arts. 543-A e 543-C, do CPC/1973) –, a
novel regra é de interpretação da lei, não de valoração da prova (que continua
sendo livre).
O CPC/2015 não excluiu o julgador, tolhendo
qualquer espaço de liberdade decisória. Além da autonomia na valoração motivada
da prova, mesmo em matéria de interpretação do Direito há espaço para a
liberdade de convicção. O art. 489, § 1º, VI, do CPC/2015, ao indicar, a
contrario sensu, que o juiz pode deixar de seguir enunciado de súmula,
jurisprudência ou precedente invocado pela parte, desde que demonstre, através
de fundamentação idônea, a existência de distinção no caso em julgamento
(distinguishing) ou a superação do entendimento (overrulling), prova isso.
O que houve, portanto, foi apenas o advento
de uma disciplina mais clara do método de trabalho do juiz, não a extinção da
autonomia de julgamento. Equivale dizer que a prova dentro da lei, não é
suficiente para atender o direito da demanda.
Parece-me estranho que a
cada momento o judiciário por vozes da sua mais alta Corte, rediscute e
informatização do processo judicial. Uma proposta que visava e era apregoada
como a mais eficaz para combater a morosidade, parece que mergulhou no infinito
do nada.
Mas a exemplo de medidas
anteriores, saudadas como salutar, a qualidade e agilidade da prestação
judiciária, este apenas beneficia o fluxo interno do trabalho, enquanto o
destinatário, principal ator neste mar de tormenta eletrônica, padece e se vê
fustigado da pior e mais desprezível forma, provocada pela má qualidade latente
e continua do sistema.
Isolados na soberba, onde
dirigentes de tribunais (que são juízes), promovem reformas para tão somente os
cartórios e secretarias trabalharem cada vez menos e os advogados, cada vez
mais.
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