Titular: Helio Fernandes

quarta-feira, 2 de maio de 2018


HÁ 37 ANOS, GENERAIS DITADORES E TORTURADORES, TENTAVAM PRORROGAR A DITADURA. QUE JÁ ACABARA

HELIO FERNANDES

Foi num Primeiro de Maio Exatamente como ontem. Os regimes militares de exceção terminaram, os que usufruíram, gozaram e enriqueceram com o poder ilegítimo, não se conformam. E reagem com o objetivo de continuar. Nesse Primeiro de Maio de 1981, programado para ser sangrento e catastrófico, a ditadura completava 17 anos.

Os generais que foram "presidentes", em 1979 decidiram, que Figueiredo, que assumira, ficaria até 1985, quando haveria a ultima eleição, indireta mas só com candidatos civis. Esse período dele, seria chamado de transição, uma rotina sem violência, tortura, arbitrariedade. Articulada, coordenada, comandada e executada pelo ex-Ernesto Geisel, que de ditador ferrenho, queria se transformar em herói da libertação nacional.

Só 3 fatos, que enlouqueceram os generais do Doi-Codi, e o poderoso Chefe do SNI, o 4 Estrelas Otavio Medeiros, que lutava para que depois de Figueiredo, fosse "eleito" o ultimo general, ele.  A hostilidade entre os generais do Doi-Codi, e o SNI, assustadora. Mas seus planos eram irrevogáveis.  

Setembro de 1979, deposição das armas, a farsa da "anistia, ampla, geral  e irrestrita". Asilados e exilados, voltaram para o país. Mas o CODI e o SNI, começaram o plano de derrubar o fato, de preferência com excesso de violência.

Em setembro de 1980, assassinaram Dona Lyda Monteiro, secretaria do presidente da OAB, o excelente Eduardo Seabra Fagundes. Este contou  ao grande documentarista Silvio Da-Rin, que quando ela abriu um envelope, houve a explosão, uma das paredes desapareceu. E ela, sem um braço, resistiu pouco mais. 

Fevereiro de 1981. Destruição-vingança da Tribuna da Imprensa. Surpreendente que esse crime tenha sido planejado, coordenado e executado pelo SNI de Brasília. Às 4 da madrugada, concentração de personalidades junto  com os escombros do jornal. Alceu Amoroso Lima, Ulisses Guimarães, Bernardo Cabral, Barbosa Lima Sobrinho, etc. Quem estava no Rio, lamentava a crueldade com que foi tratado o jornal.

No dia seguinte,  o Senador Franco Montoro, relator da "CPI do Terror", me convidou para ir depor. Ele seria Governador de São Paulo, no ano seguinte 1982. Quatro dias depois eu estava depondo em Brasília. Falei durante 6 horas respondendo a perguntas de Senadores e Deputados, com o plenário completamente lotado.

Agora rapidamente, um episódio que mostra o clima da capital nesse fim de ditadura. Eu tinha marcado um hotel para dormir em Brasília, pois sabia que iria acabar tarde. Quando falei isso, deputados e senadores responderam imediatamente: "Você não vai dormir em Brasília de jeito algum". Me agarraram, me jogaram dentro de um carro que foi seguido por uns 5 ou 6.

No aeroporto, trataram da passagem, me atiraram dentro de um avião, e só foram embora quando o avião decolou. Meus amigos parlamentares me disseram depois, "se ficasse aqui, você não sobreviveria de jeito algum".

1º de Maio de 1981. Sob o comando direto do General Otávio Medeiros, foi organizado, perdão, tramado, um comício no Riocentro para dezenas de milhares de pessoas. Era um anunciadíssimo show que podia ter se transformado num dos maiores massacres da história brasileira. Esse era o objetivo do General Chefe do SNI, que há anos se sentia preterido por não ter sido "presidente".

A catástrofe frustrada pelo destino, frustrou também o movimento pela prorrogação da ditadura. O próprio Otavio Medeiros, percebeu que a situação mudara completamente, passou a espalhar a idéia de que houve um movimento contra o exercito, "que não pode ser ofendido de maneira alguma, tem que ser defendido exemplarmente, que é o que faremos". 

Criou então, no seu próprio gabinete, uma comissão de inquérito, segundo ele, para responder com os fatos verdadeiros explicando "responderemos com fatos para acalmar a revolta dos militares".

Imaginem agora o que ele fez e que este repórter já contou na época na Tribuna impressa. Reuniu 4 importantes coronéis do seu gabinete, trabalharam vários dias praticamente dormindo no gabinete, e produziram um documento de mais de 100 páginas sobre o fato.

Junto com esse documento, um sumário de 3 laudas assinado pelo Coronel Job Lorena de Santana. Mas o que é que esse Coronel que não fazia parte do gabinete tinha  com o fato? Absurdamente surpreendente, mas rigorosamente verdadeiro: o Coronel Job Lorena era negro e no dia seguinte da conclusão do relatório, foi chamado pelo General Otavio Medeiros.

Entrou na sala, o General disse pra ele, "não precisa nem sentar. O que vou lhe dizer é muito rápido". Tirou da gaveta um volume enorme de documentos, entregou ao Coronel, e acrescentou: "o senhor está sendo nomeado Presidente da CPI do atentado do Riocentro. Não precisa se preocupar, nem mesmo ler.

Nesses documentos estão todos os fatos sobre o crime que praticaram e cuja culpa querem colocar no Exercito do qual o senhor faz parte. “Esse relatório, o senhor vai assinar com a responsabilidade de Coronel do Exercito". 

Disse então para o Coronel: "o senhor pode se retirar. Quero lembrá-lo que o Exercito tem promoções em setembro e o senhor será promovido a General".

PS - Em setembro aconteceu realmente, não esclareceram os fatos, mas o Exercito ganhou um General negro.

PS2 - O Coronel Job não podia recusar de jeito algum. Se o fizesse, seria humilhado, enxovalhado, desprezado, passado logo para a reserva. Aceitando o inevitável, ficou general por 1 ano, nada mais do que isso.

PS3 - O General Otavio Medeiros, sabendo que estava ultrapassado e sem mais nenhuma chance, em 1984 passou para a reserva, continuou em Brasília, isolado, abandonado, num ostracismo terrível. Morava sozinho e só saia de casa para ir ao supermercado. Ia a pé, andando pelas ruas sem ser reconhecido.

Um comentário:

  1. Origem e razões, para os atritos, embates e dizimação dos “crê-dores”.
    Adendos, em: http://www.espada.eti.br/n1015.asp
    http://www.espada.eti.br/ce1073.asp
    http://www.espada.eti.br/onu.asp
    http://www.espada.eti.br/fagan.asp
    http://www.espada.eti.br/futuro-2.asp

    ResponderExcluir