Titular: Helio Fernandes

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

UMA ESTREIA NA DEFENSIVA
FERNANDO CAMARA
05.02.15
   A reunião ministerial da última terça-feira e a eleição dos comandantes do Congresso Nacional, deixam patente que a presidente Dilma Rousseff perdeu o primeiro mês em várias frentes. Em termos políticos, foi-se a chance de se preparar para ter uma vida um pouquinho menos complicada depois do carnaval, quando o Parlamento funcionará de fato. Em relação ao grande público, fez a defesa do ajuste fiscal, mas não respondeu o que vem por ai, limitando-se a mudar o visual, quando se referiu à batalha da comunicação. Ou seja, não quer o Governo questionado e sim distribuindo a sua verdade.
   O processo eleitoral do Parlamento só veio corroborar essa tese de que o governo quer apenas sua verdade. Ao longo da última semana, quase todos os ministros de estado, à exceção dos seis do PMDB, fizeram campanha ostensiva em busca de votos para Arlindo Chinaglia, do PT, especialmente, os palacianos, com destaque para Pepe Vargas, de Relações Institucionais. O resultado foi o PT com "jeitão de minoria", conforme destaca a coluna Brasília-DF do Correio Braziliense de hoje, reproduzida abaixo:
Um PT com jeitão de minoria
     Nem governo, nem oposição. O maior vencedor das votações definiram os comandantes do Congresso Nacional foi a parcela que negocia os projetos individualmente. Significa que, daqui para frente, Dilma viverá no Parlamento a cada dia a sua aflição, sem um grande grupo fechado com o governo na alegria e na tristeza ou destinada a fazer oposição sistemática. Pior para o governo. No Senado, Dilma está à mercê do grupo de Renan Calheiros.
       Na Câmara, apesar do discurso conciliador de estreia do presidente Eduardo Cunha, o PT e o governo Dilma colheram a maior derrota da sua história desde que o partido assumiu o comando do país. E não terão vida fácil, uma vez que, dentro do PMDB começam a surgir frases que sugerem a renúncia de Dilma: "Ela deve deixar e entregar logo para o Michel, que vai trocar tudo na Petrobras, na Eletrobrás e no BNDES", afirmava solto o deputado Darcisio Perondi (PMDB-RS).
O passado ensina
    Foi a terceira vez em que, apesar da base desunida, um governo escolheu um candidato, influiu diretamente no processo eleitoral do Parlamento e perdeu. A primeira, em 2001, Aécio Neves foi candidato ao comando da Casa sem o apoio do presidente Fernando Henrique Cardoso e derrotou Inocêncio Oliveira, do então PFL. Depois, em 2007, o PT jogou suas fichas divididas entre Luiz Eduardo Greenhalgh (SP) e Virgílio Guimarães (MG). O governo fechou com Greenhalgh e levou Severino Cavalcanti (PP-PE) como o troco do plenário num processo eleitoral que varou a madrugada.
    Ontem, não foi diferente. A eleição de Eduardo Cunha veio como resposta ao governo, que cometeu uma sucessão de erros fruto dessa mesma gênese. O Planalto, desatento para a necessidade de segurar a base em torno de um único candidato ainda em 2013, deixou que o PMDB corresse solto.
Festival de tropeços
 Quando o PT entrou com Arlindo Chinaglia candidato era tarde demais para reivindicar a posição. Feito isso, o governo jogou o peso em favor do petista, num cenário desfavorável por conta da má condução política na escolha dos ministros. O PP, por exemplo, não se conformou por ter perdido o Ministério das Cidades para o PSD de Gilberto Kassab. Fechou com Cunha. E o PSD, por sua vez, mandou votar em Chinaglia sem sequer reunir a bancada para discutir a escolha. Resultado: muitos insatisfeitos, ao ponto de terminar indicando para a mesa Diretora Felipe Burnier um aliado de Eduardo Cunha.
   Como se não bastasse os erros de condução, na última hora o partido ainda deixou solta a formalização do bloco de apoio, o que terminou por deixar o PT no pior dos mundos dentro do Congresso. num ano de CPIs pululando, Operação Lava Jato desaguando na política e dificuldades de toda ordem para o governo, os petistas terão cara de minoria na Casa. Além de ficar fora da Mesa Diretora, ainda terá reduzido seu espaço de comando nas comissões técnicas da Casa. Perdeu a primeira vice-presidência da Casa e perderá a Comissão de Constituição e Justiça, por onde tramitam todos os projetos e também recursos quando há problemas nas votações em plenário. Ali, mandará um aliado de Cunha.
Moral da história I
    O governo começou a ter consciência do estrago que seria feito pelo PMDB ainda na noite de sábado. Foi quando Michel Temer ainda procurou Eduardo Cunha em busca de um acordo: Arlindo retiraria para formar uma candidatura única e o compromisso de que os petistas ficariam com o comando da Camara no segundo biênio. Cunha recusou. Confiante nos votos e no trabalho formiguinha que fez desde o ano passado, preparava-se para colher os louros. O PT, portanto, ficara quatro anos fora dos principais espaços da Câmara.
     Para completar, ao que tudo indica, não poderá sequer recorrer à voz rouca das ruas para compensar os erros e as falhas na política. Diante do cenário econômico difícil e as mazelas na Petrobras, nada leva a crer que o povo clamará por Dilma agora como clamou por Lula nos tempos do mensalão. Por tudo isso, restará ao governo, aprender a exercer a política de forma a conviver com um Parlamento onde seu partido estreia com “ares de minoria".
    O PT pode até tentar reduzir esse estrago, mas terá que despender muito mais energia para consertar os erros da largada. O fato de ficar tudo para depois do carnaval indica que o PMDB negociará cargos de segundo escalão antes de nomear os integrantes das comissões técnicas, onde os aliados de Eduardo Cunha e Renan Calheiros são maioria. Ambos não só venceram uma eleição, como ganharam em termos de confiança dos colegas. Cunha usou a expressão "presidente de todos" em seu discurso. Se brincar, até de Dilma Rousseff, na fragilidade em que a presidente se encontra
     A análise dos votos de Luiz Henrique, o adversário de Renan no Senado, e de Júlio Delgado, o representante da oposição, mostra que, entre os senadores, Dilma pode ter dificuldades em relação a instalação de CPIs e que na Câmara, Aécio Neves mantém a liderança no PSDB. Embora não tenha obtido nenhum cargo de destaque na Mesa Diretora, que chegou a ser oferecido pelo PMDB, ele provou que o PSDB segue o seu comando. Quanto ao PT, nunca esteve tão isolado.
    É nesse cenário que a presidente Dilma Rousseff terá que lidar com todas as crises que, em escalada, assombram seu segundo mandato. A crise de energia compromete o desenvolvimento, a Petrobras não estancou seus problemas. Até hoje não se sabe qual o valor desviado da companhia. Começam a aparecer "Relatórios técnicos" contendo pareceres contrários a construção das refinarias.
    Aos poucos, a imagem da empresa se esvai, num misto de corrupção e incompetência gerencial. E logo ali na frente, os políticos entrarão nessa cena, com muitos tentando jogar lenha sobre a campanha presidencial de Dilma a fim de tirar de foco os congressistas envolvidos no escândalo.
Lula também não está totalmente preservado, haja visto que o nome dele tem sido citado insistentemente pela imprensa portuguesa como ligado à Odebrecht-Pt (Bento Pedroso Construtora), empresa que acabou enroscada nas investigações que atingem o ex-primeiro ministro José Sócrates.
Moral da história II
Nunca antes na história deste país... um Presidente da República em início de mandato se deparou com tantos problemas, e nunca se viu tantas ações inadequadas para solucionar crises.


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