10.10.15
HELIO FERNANDES
*materia reprisada
A grande surpresa não foi o Congresso aprovar o golpista Castelo Branco,
mas os rumos que Costa e Silva e Cordeiro, unidos eventualmente, deram ao
golpe. Fizeram um Ato, modificando tudo o que existia no mundo em matéria de
regime de exceção. Arbitrário, autoritário, atrabiliário. Ditatorial como os
outros, mas inteiramente diferente.
Cordeiro furioso, não sobrou lugar para ele, Costa e Silva ficou como
Ministro da Guerra, temido por todos. Fizeram então esse Ato, num bloco de
papel, pequeno, da mesma forma que Lucio Costa, em três traços ou linhas, criou
o genial Plano Piloto de Brasília.
Isto está sendo publicado e revelado pela primeira vez, depois de 50
anos de ter saído na Tribuna da Imprensa. Textual, podem ficar assombrados com
a criatividade ambiciosa dos dois generais. Em apenas cinco itens,
sumaríssimos, mudaram e modificaram a História.
Em vez de um ditador FIXO, que ficaria no Poder pelo tempo que fosse
possível. Um ditador ROTATIVO com uma ditadura permanente. Teve repercussão no
mundo todo, não só por causa do golpe, mas principalmente pela inovação; Jamais
existira isso, no mundo ocidental ou oriental.
Os cinco itens. 1 – O presidente teria que ser um general. 2 – Do
exercito. 3 – Da ativa e de quatro estrelas. 4 – Não haveria reeleição para
ninguém. 5 – Essas disposições teriam que ser rigorosamente cumpridas. Era
extraordinário, só que o tempo, o espaço e o destino, são invioláveis e não
podem ser entrelaçados ou planejados com tanta antecedência.
Castelo queria ficar mais tempo como “presidente”
Costa e Solva já era candidatissimo á sucessão de Castelo. Marcada para
15 de março de 1965. Golbery então, junto com os irmãos Orlando e Ernesto
Geisel, lançou a “prorrogação” do mandato de Castelo, com a aprovação do
próprio. Era Chefe do Estado Maior, se transformara em “presidente”, e não
queria deixar o cargo.
Só que Costa e Silva tinha força de Ministro da Guerra e notável
popularidade junto á tropa. Queriam que Costa w Silva assumisse logo,
liquidasse a “prorrogação”. O general foi para Vila Militar, acalmou a todos,
garantiu: “Em 15 de março estaremos no Poder”. (Não estariam, teriam que
esperar até 15 de março, mas de 1967).
A seguir, como desafio, viajou para a Europa, e no aeroporto
respondeu aos “prorrogacionistas”, satisfeitíssimo: “Embarco Ministro e volto
Ministro”. Os que estavam no Poder, desesperados e sem saber o que fazer,
desistiram de lutar contra Costa e Silva, mas tomaram sua providencias para não
ficarem subordinados ou ao alcance de Costa e Silva.
No final de janeiro de 1965, Ernesto Geisel, que era general de Três
Estrelas, foi promovido, e logo nomeado Ministro do STM, (Superior Tribunal
Militar). Golbery, que era da reserva, foi para o Tribunal de Contas da União,
também “vitalício” até os 70 anos, Mas antes de tomarem posse, trataram da
“prorrogação” do mandato de Castelo, até 15 de março de 1967. Mais dois anos,
explicavam: “Castelo assim, com esse mandato de quase quatro anos, ainda fica
menor do que outros, civis, que tinham cinco”.
Por 1 voto, “prorrogaram” Castelo
Golbery, que não tinha o menor escrúpulo ou caráter, era presidente da
Dow Chemical, a maior empresa fabricante de distribuidora de Napal do mundo.
Naquele tempo, ganhava fortunas colossais com a Guerra do Vietnã, e a
formidável derrota dos americanos.
O general que era Chefe do SNI ainda nascente, deixou o cargo, ganhou da
Dow uma fazenda maravilhosa, e de lá “exercia” o cargo de Ministro do TCU. E
comandava a luta pela prorrogação.
Conseguiram, Costa e Silva aceitou, Cordeiro desistiu da “presidência”,
foi nomeado Ministro dos Transportes, importantíssimo.
(Já havia ocupado, com enorme competência e honestidade, dois cargos
civis. Interventor do Rio Grande do Sul, quando morreu o general Daltro Santos,
isso ainda com Vargas. Mais tarde, já derrubado o “Estado Novo”, foi eleito
governador de Pernambuco pelo voto direto, quatro anos sem roubo ou violência).
Tudo começa a dar errado, menos a perda do Poder
1967, acaba o novo mandato de Castelo, ele morre num desastre de avião.
Costa e Silva assume, tem um derrame cerebral, (AVC) em 1969, os “Três Patetas”
militares tomam o Poder, mas são logo desalojados. Antes surge o tenebroso e
monstruoso AI-5, que teria provocado a “incapacidade e morte” de Costa e Silva.
E finalmente, ainda em 1969, os americanos, que apoiaram, financiaram e
garantiram com dinheiro e intimidação as triturantes e torturantes ditaduras do
Chile, da Argentina e do Brasil, entram em desespero: seu embaixador no Brasil
PE sequestrado, têm que se render á exigências deles e os ditadores do Brasil
também.
Começa uma nova Era, amargura para os americanos que querem seu
embaixador de volta, a qualquer preço. Os ditadores militares, aceitaram não
tinham opção. Mas depois se vingam inundando, encharcando e engolfando o país
num mar de sangue. Torturavam eventualmente passaram a tortura exaustivamente.
Diziam que a “tortura era indispensável”, (como confessou agora George Bush, 8
anos presidente dos EUA), mas os próprios generais passaram a saber e a ter
satisfação. Exatamente como Pinochet no Chile, Videla na Argentina.
Aqui, todos os generais morreram “anistiados”, o debate não é para punir
e sim saber quem torturou mais.
Carlos Lacerda e Roberto Marinho: os dois sem qualquer preconceito
Em 1962, caiu um edifício de 12 andares, no Bairro Peixoto, zona sul do
Rio. Muitos prédios construídos ali, um antigo e profundo lamaçal.
Imediatamente a Câmara Municipal aprovou projeto reduzindo os gabaritos para
seis andares, naturalmente em prédios novos.
Carlos Lacerda era governador, Roberto Marinho comprou o terreno, queria
construir outro edifício com os mesmos 12 andares. Sem preconceito ético de
nenhuma espécie pediu ao governador licença para repetir o número de andares.
Lacerda negou, respondeu: “Se eu violar o novo gabarito, posso ir preso
na hora”. O dono do “Globo” passou a atacar o governador diariamente na
Primeira. Um amigo perguntou a razão, Lacerda sem o menor preconceito racista,
explicou: “Isso é coisa do Roberto azul Marinho quase preto”.
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