PUBLICADA
EM JANEIRO/14
HELIO FERNANDES
03.12.14
A Folha, como é seu hábito,
colocou um tema, parlamentarismo ou presidencialismo, convidou duas excelentes
personalidades para dizerem SIM ou NÃO a um dos regimes. Os escolhidos, Ives
Gandra da Silva Martins e Claudio Gonçalves Couto, cheios de conhecimento,
categoria e credenciais, merecem todos os louvores pela indicação, mas não
pelas respostas.
Só que a culpa não foi deles. A
pergunta implicava na obrigação de responder SIM às eleições INDIRETAS no
Parlamentarismo, e NÃO, também obrigatoriamente às eleições DIRETAS no
Presidencialismo. Com isso, apesar da competência do jurista e do cientista
político, (os dois além do mais professores) o que surgiu foi uma complexa e
extravagante irrealidade.
Agravada por outra obrigação: a
de opinar sobre o mérito dos regimes. O parlamentarismo é melhor ou pior do que
o presidencialismo? E na pergunta estava implícito e quase explícito, que
presidencialismo rima com diretas e parlamentarismo com indiretas.
Ora, as Constituições mudam, e
com elas os regimes. O parlamentarismo na Europa, teve sempre o Primeiro
ministro eleito pelo voto direto. E o Presidente, uma notável figura,
geralmente com mais de 80 anos. Escolhido por unanimidade, mas indiretamente.
Presidencialismo puro, só nos
Estados Unidos
E 1960, a constituição da França
mudou com De Gaulle, o presidente (ele) passou a ser eleito diretamente. E a
nomear e demitir o Primeiro Ministro. É que a França teve muitas Constituições,
reconheçamos, quase tantas quanto o Brasil.
Os EUA só tiveram uma, é também o
único país do mundo ocidental que conquistou a independência, (derrotando a
poderosa Inglaterra) e simultaneamente implantando a República e o
presidencialismo. Com uma única Constituição, desde 1788. (Em 1936,
praticamente em plena guerra, Hindenburg era presidente eleito da Alemanha,
Hitler Primeiro Ministro. O marechal morreu logo, Hitler acumulou os cargos,
alguns juristas protestaram, “desapareceram”.
A eleição nos EUA é diretíssima,
bem ao contrário das indiretas
O sistema parece complicado, por causa
disso é analisado e consagrado como indireto. O que acontece, é que nas
vésperas da constituinte, os americanos tiveram a sabedoria de realizar a
convenção da Filadélfia, que durou cinco meses.
Ali “jogaram fora” os assuntos
sem importância, selecionaram para a Constituinte, alguns sobre os quais não
havia entendimento, as divergências eram inconciliáveis.
“Estadualismo ou Federalismo?”
Esse era o ponto de maior
controvérsia. As 13 províncias, que só foram transformadas em estados, na
constituinte, queriam uma constituição “estadualista”. Os “pais fundadores”
(como os oito se intitulavam) estavam determinados a aprovar uma constituição “Federalista”.
Os primeiros presidentes foram eleitos pelo partido Federalista, criado junto
com o Republicano. O Democrata foi criado em 1829, 40 anos depois da posse de
Washington.
A Constituição ÚNICA dos EUA
Os EUA mudaram muito, nenhuma
surpresa ou contestação. Em 1776, as 13 províncias que não tinham nem nome, se
rebelaram. Desafiaram a poderosa Grã-Bretanha, “dona” de quase o mundo todo.
Essas províncias, desarmadas, ou
melhor, armadas apenas com o Manifesto de 17 laudas, redigido por Thomas
Jefferson. E que mais tarde, intelectuais proclamaram: “Esse texto é o que
melhor já se escreveu em língua inglesa, excetuado naturalmente Shakespeare”.
Juntaram 32 mil homens,
comandados pelo civil Washington, logo chamado de “general” Washington. E que
seria o primeiro presidente, eleito junto com a promulgação da Constituição, em
1788.
A Convenção da Filadélfia
Em 1782 os ingleses se renderam,
apenas uma exigência: voltariam livremente para a Inglaterra, reconheceriam a
Liberdade e a Independência dos americanos, num tratado assinado em Versalhes.
(Depois da Revolução Francesa, tudo acontecia em Versalhes).
Os “pais fundadores”, como eles
mesmos se identificaram, convocaram imediatamente o que chamaram de “pré-constituinte”.
Levaram cinco meses discutindo: o que deveriam aprovar por unanimidade e
portanto não levariam para a constituinte. E o que não obtinha acordo seria
objeto de discussão na Constituinte.
Foram debates acalorados
Começaram pela duração dos
mandatos presidenciais: Washington, Jefferson, Adams, Madison, Monroe e outros,
queriam apenas dois anos. Concederam três, depois quatro sem reeleição. Mas a
maioria era tremenda, tiveram que concordar com “mandato ininterrupto”. Todos
governaram por oito anos, não quiseram mais.
A partir da emenda constitucional
número 24 de 1952, impuseram o que existe até hoje: mandato de quatro anos, uma
reeleição por mais quatro, e aí fim da carreira pública. O presidente deixa o
cargo não pode ser mais nada, nem eleito nem nomeado. Ficam fazendo
conferencias, “deduzíveis”, ganhando fortunas.
Como se vê, os “pais fundadores”
estavam certos, 64 anos depois reconheceram que eles estavam no campo
democrático. O mandato presidencial ininterrupto, como existe ainda na França
(reduziram de sete para cinco anos) é uma pré-ditadura autorizada e
constitucionalizada.
Os 4 mandatos de Roosevelt
forçaram a mudança
Federalistas e Republicanos,
depois Republicanos e Democratas, nunca mantiveram relacionamento muito
amigável. Mas quando Roosevelt se elegeu em 1932, 1936, 1940 e 1944 e ainda
estava com 61 anos, decidiram fazer a modificação. O primeiro a se submeter a
essa emenda constitucional foi Eisenhower. Eleito em 1952, reeleito em 1956,
teve que ir para casa em 1960. E seu candidato favorito, Nixon, perdeu para
Kennedy.
Erraram nos golpes e nas guerras
externas
A República dos Estados Unidos
nasceu isolacionista e preocupadíssima com golpes de estado, como acontecia no
mundo. Por isso, só mandaram tropas para fora do país, em 1898, para defender
Cuba do ataque da Espanha. E por ironia, ou qualquer outro motivo, construíram
em Havana a Fortaleza de Guantánamo, hoje templo da tortura. Ganharam a guerra,
dominaram Cuba, entraram nas Filipinas. Mas continuaram isolacionistas,
praticamente até a Segunda Guerra Mundial.
Não houve golpes, trocados por
assassinatos
O país foi crescendo tomando
terras dos vizinhos, principalmente do enorme México. Até chegar aos 50 estados
de hoje. Nenhum golpe, mas diversos assassinatos, até mesmo de alguns dos mais
destacados personagens. Até Lincoln, um dos seus maiores estadistas, foi morto
por causa da sua visão e convicção antiescravagista e a burrice dos Estados do
Sul.
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