Titular: Helio Fernandes

quinta-feira, 20 de julho de 2017

EXCLUSIVO: “50 ANOS DA MORTE DE CASTELO BRANCO”

A morte do Sr. Humberto de Castelo Branco

HELIO FERNANDES

*Matéria publicada na edição nº 5.321 -Tribuna da Imprensa em 19.07.1967

Nunca pude entender o fato de chorarem e lamentarem TODAS as mortes indistintamente. Se todos têm que morrer um dia, se a morte é finalização natural e inevitável da vida, sempre escapou à minha compreensão o fato de todos se nivelarem todos na mesma dor, moços e velhos, heróis e covardes, talentos e medíocres, gente que contribuiu para o progresso e a dignificação da humanidade e gente que não fez outra coisa senão explorá-la.

A vida é que classifica os homens e a morte, sendo inevitável, não pode ser mais do que um julgamento, um encontro de deve e haver. Se os canalhas também morrem, porque consagrá-los com as mesmas lágrimas que destinam e que não tiveram medo da vida, e deram a ela todo o seu desprendimento e toda sua grandeza?

É digna de meditação e confissão de Humberto de Campos que quando tinha cinco anos de idade, compareceu orgulhosamente diante de outros meninos de rua porque era o avô dele que estava morto, e não o avô dos outros... O famoso escritor já tinha a intuição de que a morte era um julgamento, e que influencia-lo estava acima de suas forças, Não podendo influenciá-lo  comemorava-o...

Nestes dias mesmo, ocorreram algumas mortes sentidas e lamentadas, umas pela saudade antecipada que provocaram; outras porque cortaram inesperadamente uma obra interminada: outras porque morriam e cumpriam integralmente o seu dever, e se despediam da vida, levando a admiração e o respeito dos que aqui ficavam. Foi assim com Fontenelle, com Ribeiro da Costa, com Vivien Leihg, com o cego Aderaldo.

Com a morte de Castelo Branco (acontecida ontem num desastre em Mecejana), a humanidade perdeu pouca coisa, ou melhor: não perdeu coisa alguma. Com o ex-presidente desapareceu um homem frio, impiedoso frio, implacável, desumano, calculista, ressentido, cruel, frustrado, sem grandeza, sem nobreza, seco por dentro e por fora, com um coração que era um verdadeiro deserto do Saara.

Incapaz para as grandes admirações, incapaz de enxergar a beleza da vida, incapaz de perceber que a vida não é um desfile de misérias e crueldade diante da qual êle se mantinha indiferente) e que precisamente os homens que se rebelaram contra esse estado de coisas é se exaltam em acima da pequenez comum, o sr. Humberto de Castelo Branco, fez do exercício do Poder uma coisa humilhante e pouco edificante, morrendo sem seguidores e sem admiradores, e até sem amigos, íntimos ou não.

Na sua concepção de vida, o sr. Castelo Branco cometeu um erro fatal, um erro que estava visceralmente dentro dele. Ele pensou que a arrogância, a prepotência e a presunção é que elevavam os homens no conceito geral, quando a classificação é inteiramente diferente, feita de forma invisível, mas rigorosamente infalível. É a própria grandeza de cada um, ou a própria mesquinhez que lhes garante um lugar num lado ou no outro. E o sr. Humberto de Alencar Castelo Branco,. Era inapelavelmente na vida, e será sempre, depois da morte, um homem mesquinho e sem grandeza.

*Na próxima edição a segunda parte da matéria



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