A CUMPLICIDADE DOS MILITARES HOJE NA ATIVA, CÚMPLICES PELO SILENCIO. E O
LIVRO IMPERDÍVEL COM DEPOIMENTO MAGESTOSO DE SOBRAL PINTO, SOBRE A DITADURA
VARGAS.
HELIO
FERNANDES
(MATÉRIA
PUBLICADA EM DEZEMBRO DE 2015)
Nenhum dos militares, hoje na
ativa, participou de qualquer ato de violência, crueldade, selvageria do golpe
de 1964. Digamos que tivessem saído da Escola Militar, da Escola Naval, ou da
Escola da Aeronáutica no dia 1º de abril, quando assaltaram o país, ou no dia 9
de abril desse macabro e tenebroso 1964 quando tomou posse o primeiro
usurpador, Castelo Branco.
A idade é uma só para as três
unidades militares. 21 anos. Digamos que tenham ficado na ativa até á idade
limite, 64 anos. Assim no ano 2000, teriam 57 anos, já seriam generais ou não
estariam na ativa. Em 2007 completariam os 64 anos limite. Portanto, há sete
anos não existe um só militar que tenha participado dos atos arbitrários,
autoritários atrabiliarios. Mas devem ser execrados pela cumplicidade
silenciosa e corporativa em “defesa” dos ditadores de plantão.
Desde que foi criada a Comissão
da Verdade, se recusam a colaborar, fornecer informações, mostrar que o que
negaram até agora é um ato repulsivo de colaboracionismo. (como se chamou BA
França em 1940, quando Hitler tomou Paris e foi exaltado por franceses liderados
pelo ex-herói Marechal Petain).
Em 1964 o Exercito dividido,
sufocados os contra o golpe
Quando digo Exercito é porque a
predominância deles era total, indecorosa, perigosa, criminosa. Marinha e
Aeronáutica “colaboravam”, (novamente a palavra imprescindível), se destacaram
no exercício da tortura e da violência.
Em julho de 1963, antes do golpe,
fui preso por publicar uma circular sigilosa e confidencial, assinada pelo
Ministro da Guerra, general Jair Dantas Ribeiro. O importante: fui mandado para
o BIC, Batalhão de Investigação Criminal, minha estreia na Rua Barão de
Mesquita. Ainda sem CODI, que seria criado e comandado pelo general Orlando
Geisel.
Fiquei lá três dias, até meus
advogados, (Sobral Pinto, Prado Kelly, Adauto Cardoso e Prudente de Moraes
neto) pedirem ao bravo Ribeiro da Costa, presidente do Supremo, minha
transferência para Brasília, mas nesses três dias, pude constatar pessoalmente,
como o exercito estava dividido. Já se conspirava abertamente, mas também, nos
quartéis, se resistia também abertamente.
Não quero contar a História, mas
apenas mostrar que os militares não eram todos golpistas. É lógico, esses
tomaram o Poder por 21 anos com os crimes e a impunidade garantida à vida
inteira e sobrevivendo depois da mote. Sabiamente morreram antes da
c-r-i-m-i-n-a-l-i-z-a-ç-ã-o. Ao contrário do Chile da Argentina, onde todos
morreram na prisão.
Eu estava incomunicável, mas na
hora do banho de sol, me levavam para fora, queriam fingir de magnânimos.
Andava por aquele páteo enorme, lógico, cruzava ou emparelhava com oficiais.
Muitos me diziam: “Helio, resista, estamos com você”. Outros, com o ódio na
alma, na mente, no coração e nos olhos, acreditavam que podiam me fuzilar á
distância.
Os que comandam hoje, ofendem o
Exercito
Até agora, desde agosto e
setembro de 1979, “decretaram” o que não podiam fazer. O fim da tortura
ostensiva, a negativa dos crimes cometidos, e por fim, um crime ainda pior:
“Anistia ampla, geral e irrestrita”, que só serviria a eles.
E que anos mais tarde,
imprudentemente e sem poderes para isso, o Supremo Tribunal consideraria
constitucional. O Supremo ainda pode se reabilitar, votando pela
inconstitucionalidade do que eles mesmos referendaram sem sentir culpa ou
remorso.
Os que
comandam hoje, e não participaram de nada nos porões do Exercito, FAB, Marinha,
até agora se negaram a reconhecer que esses porões existiram, enxovalharam as
Forças Armadas, negaram toda e qualquer violência do Exercito no passado.
Agora, em posição cúmplice, omissa pelo corporativismo, insustentável pelo
conhecimento do que houve, dão sinais de que pretendem falar.
Não acredito neles, não aceitamos desculpas mentirosas e retardadas, não torturaram fisicamente ninguém, mas mantiveram o país no mais completo desconhecimento de tudo.
No dia 9
de Abril de 1964, Sobral Pinto mandou carta a Castelo Branco na sua posse. Mas
no dia 29 do mesmo Abril, tomando conhecimento da tortura, mandou nova carta a
Castelo: "O senhor é chefe de estado maior do exercito, não pode fingir
que é presidente". Castelo tentou falar com Sobral, não conseguiu de jeito
algum.
PS- É preciso examinar e reexaminar a posição dos presidentes civis que colaboraram com a ditadura e não permitiram investigação. Começando com Sarney, serviçal da ditadura, depois presidente por acidente. Mortal para a história por muitos e vários motivos.
"Sobral Pinto": um livro imperdível
Recebi nessa segunda feira, na terça já havia terminado de ler as 316 paginas dos 40 capítulos. Emocionante da primeira a ultima pagina, é estarrecedor em todo o relato sobre a tortura de Harry Berger, o homem mais torturado da historia do Brasil.
Advogado de Prestes e de Berger, além do retrospecto da vida do inimitável defensor, o único que esteve ao lado de presos políticos em duas ditaduras: a de Vargas apoiado pelos militares, a dos militares (generais) garantida pelos civis.
Além do relato das dificuldades do próprio Sobral, que não cobrava de ninguém, não atendia nem os apelos da própria mulher, "Sobral, cobre alguma coisa, não temos nada em casa". Continuou imperturbável, não mudando o mínimo que fosse do seu comportamento como advogado.
O relato capitulo por capitulo, pagina por paginam linha por linha, obriga a uma retificação do próprio repórter. Eu sempre escrevi, que "Prestes foi o prisioneiro mais torturado do Brasil". Sabia que Berger havia "enlouquecido" com a tortura e com o regime de prisão a que foi submetido durante dois anos.
Mas não
tinha ideia do que Berger sofrera nesse tempo todo. Sobral, sem o mínimo de
esmorecimento escrevendo e procurando pessoalmente juízes, Ministros da
Justiça. E até para o ditador Getúlio Vargas que se recusou a receber Sobral
Pinto, mas não pode deixar de ler a carta minuciosa e candente, que Sobral
escreveu a ele. Leu e não tomou nenhuma providencia.
Dois anos num vão de escada
Ninguém pode sofrer mais do que Berger sofreu. Segregado, sem sol, sem qualquer forma de limpeza, Berger estava num espaço, como define Sobral: "Era tão pequeno, que ele não podia ficar em pé, sentado ou deitado". Sobral também esclarece: "Pedi realmente a colaboração da Sociedade Protetora os animais, mas não para Prestes e sim para Berger”.
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