Titular: Helio Fernandes

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

MARIGHELLA: A GUERRILHA TRAÍDA, INFILTRADA, BRUTALMENTE ASSASSINADA

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

Parte - II

A conversa sobre guerrilha

Deixei o carro no Jardim do Meyer, além de ter nascido ali, ia muito à casa do extraordinário Agripino Grieco, que espantosa biblioteca. Os jornais naquela época tinham o que ficou eternizado como “rodapé”. Pela forma como eram colocados nas paginas e pela importância dos que escreviam.

Na verdade foram os precursores do “colunismo,” mas “Nossa Senhora”, que genialidade. Agripino foi o primeiro, depois vieram Alceu Amoroso Lima, Álvaro Lins, Eduardo Portela, todos grandes amigos do repórter. Sabia que em 15 ou 20 minutos estaria na casa do Marighella.

Genialmente automático. Olhei o numero da casa, atravessei a rua, a porta se abriu. 19 anos depois, reencontrava Marighella. Já era uma lenda, ainda iria mais longe, se transformaria em legenda, como conta magistralmente Mario Magalhães. Entramos logo no assunto.

Começou: “Helio, quando posso acompanho a tua luta, e tenho enorme admiração pelo teu poder de analise, por isso pedi para você vir aqui”.

O que ele queria, não demorou: ”Helio, estamos organizando a guerrilha, queria saber a tua opinião”. Ficou em silêncio, respondi: “Não tenho nada contra a guerrilha como forma de luta, o que me interessa é a proporção das forças. Quantos serão esses guerrilheiros?”.

“Seremos 60 no Maximo” 
    
Fiquei assombrado, sabia que não formaria um exercito, era uma força para combater. Incomodar o adversário, sem nenhuma possibilidade ou pretensão de vitória. Mas não queria desacreditar a vontade de ninguém, eu estava ali para analisar e não para desencorajar.

Falei para um Marighella atento, silencioso, mas muito bem informado: “O Exercito vai partir com tudo para cima de vocês. Pode ficar certo que serão 60 mil armadíssimos, contra 60 de vocês, que terão que enfrentar a luta na floresta, a traição que é natural, e a ânsia de tortura dos que se jogarão sobre vocês”.

Continuei, tentando mostrar a desigualdade: “Vocês todos tem admiração pela Coluna Prestes, eu também. Mas já se passaram mais de 40 anos. O país mudou as forças armadas, agora, tem serviços de inteligência, vão localizar vocês imediatamente e saberão sempre onde vocês estarão”.

Passei para a História de Canudos e Antonio Conselheiro: “O Exercito mandou três quartas partes do seu efetivo, para lá. Envergonhados, chamaram a quarta “expedição suplementar”. Assassinaram todos em Canudos, na quarta expedição levaram até canhões, que montaram num morro chamado FAVELA". 

Que depois seria imortalizado e eternizado, nos morros do Rio, pelo único que escapou de Canudos.  E reprisei: “Morreram todos. O único “herói” de Canudos, foi o Coronel Moreira Cesar, conhecido muito verdadeiramente, como “coronel corta-cabeça”. 
  
PS – O encontrou levou duas ou três horas, já sabíamos que havia terminado. E logo Marighella levantou, me abraçou: “Foi ótimo ouvir você. Toda luta tem riscos, você faz a tua parte que é importantíssima”.

PS2 – Continuou: “Você sabe muito bem, ou não teria sido convocado, que resistiremos, haja o que houver. Não vou contar nada aos companheiros, mas nossa decisão é definitiva. Considero tua analise positiva, em nenhum momento você negou a guerrilha”.

PS3 – Não me pediu silencio, não disse para manter a conversa entre nós, me conhecia. Guardei sigilo por 46 anos, mesmo depois de tudo ter acabado. Agora, conto, como homenagem ao bravo lutador.

PS4
 – Nunca mais encontrei Marighella. Ainda me lembro de suas ultimas palavras, não me levando até a porta: “Saia pelos fundos, você entrou pela frente”. Não era recomendação, e sim um dos segredos da clandestinidade.

 

 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

MARIGHELLA: A GUERRILHA TRAÍDA, INFILTRADA, BRUTALMENTE ASSASSINADA

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

Parte - I

Conversa interessantíssima, importante, pelo conteúdo, e que deixa bem claro, a razão dos comunistas serem mestres da clandestinidade. Durante vários períodos ficavam livres, apareciam. Logo, logo voltavam a serem procurados, desapareciam.

É a primeira vez que escrevo sobre o fato. Nem na Tribuna de papel nem no blog. Sabia que o grande jornalista e escritor Mario Magalhães fazia biografia elucidativa do líder comunista, não contei nada a ele. Não queria dar a impressão de que pretendia aparecer. Só falei com ele mês passado, quando a biografia já era sucesso de critica e de bilheteria, com várias edições.

Meu relacionamento com Marighella

Conheci os 14 deputados comunistas e mais o Senador Luiz Carlos Prestes, na Constituinte de 1945. Que promulgou a tão esperada Constituição, em 18 de setembro de 1946. Mocíssimo, Secretário-adjunto da Revista O Cruzeiro, fui cobrir os trabalhos. (Ainda não existiam os editores. Foi o bravo jornalista Pompeu de Souza, que morou anos na Inglaterra e nos EUA, que trouxe a palavra. Implantada por ele na belíssima fase jornalística do Diário Carioca).

Como eu ia à constituinte durante 7 meses e 18 dias, e como era de uma revista importante, fiz amizades. Não era nem nunca fui comunista, mas minhas inclinações progressistas eram visíveis na convivência e no que escrevia. Daí as conversas com Grabois, José Maria Crispim, Lamarca, Jorge Amado, e lógico, Marighella, personagem de hoje.

Com Prestes conversei também varias vezes. O que não me impedia de ficar furioso, quando ele e Plínio Salgado sentavam juntos amigavelmente. E depois, os dois na tribuna, se agrediam (é a palavra) violentamente.

Separados Câmara e Senado, continuei freqüentando as duas casas, com os comunistas, até 1948. Nesse ano o partido (Partidão) teve o registro cassado. Prestes foi avisado pelo seu advogado na ditadura do “Estado Novo”, e para sempre seu amigo pessoal, o bravo Sobral Pinto. Todos foram embora, ninguém foi encontrado ou preso. Embora não tivessem fugido do Brasil.

“Marighella quer conversar com você, com urgência”
 
Um dia, antes do AI-5, mas com o endurecimento mais que visível nas ruas, e os prisioneiros sofrendo na carne a tortura impiedosa, tortura que era a base, a idolatria, filosofia e ideologia dos generais, me telefona um grande amigo, que não via ha tempos.

Excelente figura, líder comunista, morreu ha mais ou menos três anos, fui ao enterro. No telefonema não disse o que esta no titulo destas notas, era sabido, discreto e eficiente. Textual: “Helio, pode me encontrar ás 2 horas da tarde?”. Nem podia recusar, ele completou: “Então me encontre na Avenida Rio Branco esquina de Assembléia”.

Não disse mais nada, desligou. Nessa avenida, quando abre o sinal para os pedestres, passam uns 300 para um lado ou para o outro. Não olhou para lado algum, o sinal ficou verde, disse, “vamos”, tirou um papel do bolso, e no meio daquela confusão, me entregou sem uma palavra, era a lição maior da clandestinidade.

Li rapidamente fiquei surpreendido. Era um endereço no Cachamby, quase um sub-bairro do Meyer, onde nasci. Perguntou, “decorou?”. Como respondi afirmativamente, terminou: “O Marighella está te esperando às 2 da tarde, não toque a campainha ele sabe quando você chegar”. 

Esperou eu dar a indicação do lado para onde iria, seguiu logo no sentido contrario, sem um aperto de mão, realmente desnecessário. Só vi quando esmigalhou o papel, que já era pequeno, foi jogando pedaços nas lixeiras.

 

 

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

 CORONÉIS DA RESERVA APENAS COADJUVANTES, AGORA FALAM ABERTAMENTE COMO “PAPAGAIOS DA TORTURA”. VOU CITAR GENERAIS IMPORTANTES, COM NOME E SOBRENOME, QUE MANDAVAM DE VERDADE, DAVAM AS ORDENS.

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

PARTE - II

Os que estavam no poder, eram divididos em sensatos e insensatos 

Falavam muito em “linha dura”, mas isso era forma de simplificar. “Linha dura” era composta por aqueles que logo queriam torturar e matar. Os outros, eram os que acreditavam em diálogo, todos, milhares, iriam sendo “passados para a reserva, como traidores da revolução”. Que iria sendo identificada com sua própria fisionomia de golpe.

Depois de um tempo de silêncio, o general falou para um coronel: “Onde está o carro que vai levar o jornalista?”. Uma quase revelação, eu iria para algum lugar, poderia ser bom ou ruim. O carro chegou, me levaram até ele, Fiuza disse para o coronel: “Vá com ele, não quero que desapareça pelo caminho e nos acusem e culpem”.

Parecia um destino razoável, mas fiquei ainda sem saber. No carro o coronel (de uma grande família de militares de carreira) me disse: “Vamos para o Hospital Central do Exército”. Mas terminou com uma declaração surpreendente: ”Ao senhor não vai acontecer nada”. Naturalmente com outros ACONTECERIA.

Fiquei lá uma semana, a única satisfação era a conversa com o médico. Sobrinho de Manoel Bandeira, contava histórias admiráveis dele. Uma semana depois fui libertado. Na portaria do hospital, em Bonsucesso, me entregaram mala com roupas. Provavelmente minha família sabia, não me falaram nada. Peguei um taxi, logo estava em casa. 

Herzog foi assassinado pelos insensatos 

Preso na TV-Cultura, não era para ser morto. Mas seus prisioneiros obedeciam ordens do poderoso general Eduardo D’Avila Mello, comandante do II Exército. Já fora advertido pelo general Geisel, “não quero violência contra ninguém”. 

Quatro Estrelas, comandante do II Exército (que englobava São Paulo), suas ordens foram as mais específicas e minuciosas possíveis. Acreditava que nada iria lhe acontecer. Mas aconteceu.

Quando soube da morte (assassinato) do jornalista, Ernesto Geisel mandou preparar o avião, “vou para São Paulo”. Muitos queriam ir com ele, foi duro e definitivo: “Vou sozinho”. Chegou em São Paulo mandou chamar o general Ednárdo, disse imediatamente: “O senhor está demitido, vai chegar do Rio o novo comandante do II Exército”.

O general Ednárdo não acreditou, nunca um general comandante do Exército foi demitido dessa maneira. Ficou parado, perplexo, Geisel fulminou: “Pode se retirar, o senhor não tem mais nada a fazer aqui”. 

Confissão do general Cordeiro de Farias 

Na minha casa, só ele e o grande criminalista Oscar Pedroso Horta, Ministro da Justiça de Jânio, e talvez a única pessoa a saber da “renúncia”, Cordeiro contou o seguinte. Foi interventor no Rio Grande do Sul, e depois governador de Pernambuco, eleito pelo voto direto. Fez muitos amigos, de vários setores.

Um dia recebeu telefonema do Recife. Um amigo advogado, contava que seu filho de 21 anos estava preso no DOI-Codi, apavorado que fosse torturado. Ligou logo para Orlando Geisel, pediu providências. Relato integral de Cordeiro de Farias: “Ele me disse, vá lá na Barão de Mesquita, mostre a identidade de general, chame o coronel, (foi dizendo os nomes) diga que fala em meu nome, que em mandei soltar logo o estudante”.

Continuando: “Fui, não me deixaram nem passar da portaria, telefonei de volta para o Ministro Geisel: Você não manda nada, não pude nem entrar, nem procurar o coronel da tua confiança”. O general-Ministro perguntou onde eu estava, mandou esperar. Chegou fardado, foi demitindo todos que apareciam. O coronel encontrou o menino que procurávamos, conseguiu retirá-lo.

E Cordeiro de Farias, ainda emocionado: “Não adiantava mais nada, ele já fora torturado”. O coronel explicou que procuravam informações. E Pedroso Horta, revoltado: “Que informações poderiam obter de um estudante de 21 anos?”. 

Os personagens do “Pasquim”, presos, mas na Vila Militar 

Quero terminar com este episódio que mostra a diferença do Exército dos generais ambiciosos e torturadores e dos oficiais que repudiavam o golpe, quase todos perseguidos e expulsos.

Os jornalistas do “Pasquim” ficaram num Batalhão de Paraquedistas. 60 dias de prisão. Mas o comandante, duas ou três vezes por semana, “pernoitava” no quartel, jantava com alguns. Que diferença.

Por hoje acho o suficiente. Fui preso outras vezes, cassado, sequestrado, desterrado, proibido de escrever, e mais e mais. Os fatos que estão aqui, tiveram o repórter como personagem, observador e participante. 

 

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

 DERRUBADA A DITADURA DO “ESTADO NOVO”, QUASE 18 ANOS DE ESTRANHA DEMOCRACIA. É UMA EXCELENTE CONSTITUIÇÃO QUE SERIA ASSASSINADA EM 1964, ANTES DE ATINGIR A MAIORIDADE.

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

PARTE – I

A democracia no Brasil sempre foi ficção ou esperança, jamais confirmada. Basta dizer que apenas com um impeachment, existem quase tantos vices que assumiram, do que os eleitos que terminaram o mandato, O vazio entre um golpe e outro, era preenchido por um novo golpe. Comumente chamado de “quartelada”, a palavra não precisa de explicação.

O fim da “República Velha”, não significava que surgiria obrigatoriamente uma ”República Nova”. A de 1899 foi substituída pela de 30, este foi passando de data, até que chegou a 1964.

Duração dos golpes dependia sempre do entendimento entre civis e militares. Quando se dividiam, não havia modificações na arbitrariedade e sim nos ocupantes do Poder, fossem civis ou militares.

Até 1935 os golpes se sucediam, não ostensivamente, sem divisões. Civis e militares “assimilavam” essa estranha democracia sem eleições e até mesmo sem liberdade, credibilidade, autenticidade.

Até 1937 quando houve a grande cisão, dividindo abertamente militares contra militares, civis contra civis, uns atirando nos outros, se atingiam mutuamente, sem o menor ressentimento ou constrangimento.

Com a revolução comunista de 1935, a prisão de Prestes em 1936, o “Estado Novo” de Vargas em 1937, e a derrubada da ditadura em 1945, aconteceu muita coisa.

O movimento integralista de 1938, chefiado por Plínio Salgado, não teve a menor repercussão. Mas uma visita de bastidores, em 1940, praticamente desconhecida Até de historiadores, que escrevem sobre a “história, lendo os jornais da época”.

Stalin pede a Vargas a liberdade de Prestes.

Em maio de 1940, sem a menor convicção, mas sofrendo a pressão da opinião pública, e politicamente do estadista Osvaldo Aranha, Vargas “declarou guerra á Alemanha nazista”. Foi uma surpresa, mas que gerou consequências. E embora não noticiado na soturna e medíocre imprensa da época, importantíssimo acontecimento.

Quase no final desse 1940, Stalin mandou um alto dignitário do Politburo conversar com Vargas. Uma só frase – reivindicação: “Como agira o Brasil e a União Soviética são aliados, não tem sentido manter preso o camarada Prestes”. Esperto, malandro, com espantosa habilidade, Vargas “sentiu” o que lhe caía nas mãos.

Respondeu vagamente, tenho “que fazer consultas”, depois responderei. Prestes estava preso desde 1936, Sobral Pinto escreveu: “Prestes não foi torturado fisicamente, mas não tinha direito algum”.

O grande torturado, que enlouqueceu para o resto da vida, foi Harry Berger. Mas Vargas só se interessava pelo fato político.

Mandou construir para Prestes na Penitenciária da Frei Caneca (no centro da cidade), uma casa de madeira para abrigar o líder comunista. Dois quartos e uma sala, banheiro, cozinha, e o mais importante: podia receber visitas diárias, livros, correspondências, ficou satisfeitíssimo.

 

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

 24 horas inesquecíveis e inesperadas

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista 

Se cada um falar 1 hora, terça, ontem, ficará marcada para sempre, como gosta de dizer um ex-presidente da Republica, nunca jamais se viu algo parecido. Acordei ás 6 da manhã, como habitualmente, ligeiramente depois das 7, começam a se comunicar comigo, ligo a televisão, fico assombrado. Depois da prisão do senador Delcídio, a determinação do Ministro Zavascki, insuperável.

Vou para o computador, escrevo o que vejo e o que recebo de informe e informações, coloco no Blog, deixando bem claro que estava mudando todo o panorama visto da ponte da política, melhor, da politicalha. 

A primeira mudança, na Comissão da falta de ética: tentaram de todas as maneiras adiar mais uma vez a votação que só tinha uma palavra para ser aceita ou recusada: admissibilidade. Depois de 3 horas de pedido de mais adiamento, votação: 11 a 9 pela abertura do processo, agora começa o julgamento.

Cunha retomara o palácio oficial e monumental, assistia a votação com amigos, afirmou, “minha vida segue o normal, não fui atingido".  

Dia do Ministério Público.

Estava marcada para ontem, na Câmara, presidida por Eduardo Cunha, essa justíssima consagração. Houve mas Cunha e Janot não compareceram. O Procurador mandou mensagem, tirei este trecho, textual: "Tenho que responder sempre, até onde vai à lava jato. Não escondo, até onde for ou continuar indo a audácia da corrupção".  

O PMDB perdido, aturdido e surpreendido, 

Logo que explodiram os acontecimentos, três reuniões que duraram o dia todo, entraram pela noite, representando os três grupos que dominam ou pretendem dominar o partido: Temer, Renan, o próprio Eduardo Cunha, alvo principal mas não único, de toda a rumorosa mas aplaudida operação. 

Temer e Renan não fizeram analise, não são bons nisso. De instantes a instantes, todos se perguntavam, como se falassem com todos ou com eles mesmos. O presidente do Senado mostrava satisfação quando soube que seu nome estava na lista de busca e apreensão, foi retirado pelo Ministro Zavascki. Mas voltava o desespero lembrando a intervenção na sede do PMDB de Alagoas, (por quê?) e o aparecimento do nome do ex-senador do Ceará, ha 7 anos representando Renan, na importante Transpetro, a maior subsidiaria da Petrobras.

O vice, contrariado por ter sido atingido, não tinha paciência ou complacência para passar recibo. Como sua casa monumental ficou lotada o tempo todo, perguntava quase num sussurro: "Como estão Renan e Cunha?". Não era preocupação, e sim comparação, e a vontade de saber ou perceber se estavam com mais poder do que ele dentro do partido.  

A coletiva de Eduardo Cunha 

Não parecia que era com ele. Calmo, foi falando, não esperava perguntas. "O país todo acordou com estranheza, não havia explicação".Como surgiram rumores de que deixaria a presidência para se manter como deputado (Renan, 2007) respondeu com veemência:"Não renunciarei, continuarei minha luta pela democracia".Era meia verdade, pensara e admitira isso ,recuara, continuaria com foro privilegiado, mas a mulher e a  filha, iriam para Curitiba. 

Lembraram a ele que Bumlai, o amigo intimo de Lula, está em desespero, perto da delação premiada, por causa da prisão do filho e da nora. Sem o menor constrangimento, Cunha terminou com duas frases. "O PMDB tem que romper imediatamente com o governo Dilma, tem um Ministro da Justiça e um Procurador Geral, que só pensa em nos prejudicar".  Parou um pouco, terminou: "Vou entrar com recurso". Não explicou se era contra a decisão da Comissão, sem ética ou contra a "busca e apreensão".  

Atingiram Temer

Depois do fiasco da carta vazia, que Renan classificou de "desabafo pessoal", e nada a ver com o partido, Temer voltou , buscando os holofotes reclamando da presidente, publicamente: "A senhora tem que deixar de interferir com o PMDB". Agora, para ser coerente e intransigente, deveria fazer o mesmo pedido ao Supremo. Nada mais justo que a ação tão demorada, atingisse no momento, unicamente o corrupto presidente da Câmara. Aliás, os dois, Temer e Cunha, têm andado muito unidos. 

A propósito, o fato mais importante de hoje, quarta feira, será a sessão plenária o mais alto tribunal do país. Ninguém pedirá vista, mas o assunto fascinante, poderá seduzir os Ministros, e leva-los a votos muito longos. Se cada ministro falar 1 hora, serão 11 horas.

Hoje, terça, a politicalha de Brasília não terá fim de tarde, de noite, de madrugada. Ultrapassando essa madrugada tormentosa, (quem conseguirá dormir?) surgirá a nada radiosa manhã de quarta. Se for igual à de terça quem aguentará?

Um assunto polêmico mas obrigatório no PMDB, é a antecipação da convenção. Mesmo os que só pensavam nisso, agora não sabem mais nada. Mas tentarão conversar.

Assunto recusado por todos, dentro e fora do Congresso: o futuro de Eduardo Cunha. A repercussão contra ele foi terrível. Observação ou conclusão geral. Eduardo Cunha não tem?  Presente, como pensar em futuro? 

 

 

terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

 Petrobrás sacrificada

 HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

Depois da Lava Jato nada mais deu certo, e não podia mesmo. Publicamente tudo começou com o espantoso caso de omissão e corrupção da refinaria de Pasadena. Dona Dilma era Ministra de Minas e Energia e presidente do Conselho da empresa.

Diante do escândalo sem precedentes, fez uma declaração igualmente clamorosa, acintosa, calamitosa: "só assinei o relatório preparado pelo Diretor Internacional (já preso e condenado há 20 anos) Cerveró, porque ele era falho, deficiente e sem informações”. Todas as razões e motivos para não assinar.

Era uma soma vultosa de dinheiro, mas ninguém imaginava nem de longe que surgisse o Petrolão, Premio Nobel em matéria de roubalheira. Quando a Policia Civil Federal, o Ministério Público e o juiz federal Sergio Moro começaram a investigar, desfolhar, revelar, denunciar e divulgar as licitações denominadas de Lava Jato, o assombro foi total.

E a identificação e a classificação, irrefutáveis mas não inacreditáveis e cada vez se aprofunda e se identifica como o maior escândalo da História da República.

Já estamos na fase número 19, e as surpresas surgem a cada dia, revelando e aprisionando personagens nunca dantes responsabilizados, de tão poderosos que são, que eram mas não serão mais. E levaram de roldão a maior empresa brasileira, hoje completamente descapitalizada, desmoralizada, desacreditada.

Deve tanto, que não pode nem pensar em fazer caixa, não para pagar mas sim para amortizar. E essa dívida foi feita em dólar, a partir de 1,70 quase 2 reais. Mas hoje oscilando entre 4 reais e um pouco menos, admite que venderá ativos, loucura completa com a situação da inflação e a desconfiança dos supostos ou possíveis compradores.

Os fatos também comprometem a recuperação da Petrobras. O barril de petróleo já foi vendido por mais de 100 dólares, maravilha. A ultima cotação foi de 41 dólares e a tendência não é de alta e sim de queda maior. O último balanço trimestral apresentou prejuízo de 3 bilhões e 500 milhões de reais, e oficialmente a empresa informou: “O Pré - Sal representa 24 % da produção da empresa." Aí a culpa não é deles, mas é um roteiro que ninguém gostaria de ler ou produzir.

A extração de um barril custa entre 50 ou 60 dólares. Vendendo a 100 dólares cada barril, bastava exportar 1 milhão e o lucro desse Pré - Sal, numa aritmética tem que ser invertida. Com os mesmos números, o prejuízo passa a ser de 50 ou 60 milhões também por dia. E como a Petrobras tem um volume grande de importações (combustível, derivados, diesel, etc.) a perda de recursos é inimaginável. 

Não podemos encerrar o capítulo de hoje sem discordar (como tenho feito desde o inicio) sobre os prejuízos provocados pelas empreiteiras, todas elas, das maiores às outras. O primeiro relatório de volume das propinas, falava “em 6 bilhões de reais ". Conhecendo o desfalque, fiquei revoltado e protestei.

Agora, levantado por especialistas, eleva a roubalheira para 42 bilhões. Ainda não estou satisfeito ou conformado. 

A então presidente Graça Foster foi mantida irresponsavelmente, porque "era amiga e via novela junto com Dona Dilma ". Surpreendentemente publicou um relatório no qual colocava as perdas em 88 bilhões. Achei que estava perto da realidade. Mas a realidade transtornou a presidente da República, que imediatamente demitiu Dona Graça, nunca mais se falaram.

 

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2021

 ANISTIA AMPLA, GERAL E IRRESTRITA. GENERAIS TORTURADOS. DEMOLIRAM A TRIBUNA DA IMPRENSA                   

HELIO FERNANDES

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

A "anistia ampla, geral e irrestrita" foi uma blasfêmia totalitária. Isso e muito mais, na verdade muitíssimo. Inicialmente foi a tentativa de livrar ou absolver Médici e Geisel os dois "presidentes" que ainda estavam vivos. E mostrar ou demonstrar generosidade.

Não consultaram ninguém, apenas alguns coronéis também torturadores, muito civis que colaboraram com a ditadura, e principalmente o General Otávio Medeiros, Chefe do SNI, e que aparece igualmente o 1º de maio de 1981. Fato que comentarei, a seguir, respondendo a outro leitor, que esqueceu de assinar, (ou não quis, se quiser pode fazê-lo agora, o assunto é importantíssimo).

Os que combateram a ditadura de armas nas mãos (apenas 60, chamados de "guerrilheiros" e muitos outros assassinados nos subterrâneos da ditadura) não podiam se beneficiar. Os que estavam no exterior, asilados ou exilados, puderam voltar, "grande benefício".

Os generais (e coronéis ainda não promovidos) queriam se livrar de punições, tinham pânico de morrer na cadeia como aconteceu na Argentina e no Chile. Conseguiram a auto-absolvição e a proclamação da inocência avaliada pelos civis, tão culpados quanto eles.

Bastam dois exemplos para mostrar qual a intenção deles. Dois anos depois dessa "anistia" demoliram a Tribuna da Imprensa. Pura vingança por tudo o que o jornal representou na luta contra eles. E o fato do repórter não ter saído do país nos 21 anos em que torturaram, assassinaram, perseguiram, fiquei agressivamente combatendo.

E um episódio que não esqueceram: o fato de logo em 1979, vários advogados famosos entrarem com pedido de indenização (com minha autorização) não contra a União, mas pessoalmente responsabilizando Médici e Geisel. Tiveram contratempos, foram incomodados, precisaram se defender no então Tribunal Federal de Recursos (que acabou com a Constituição de 88) e no Supremo Tribunal Federal. Este teve a covardia de declarar: "Geisel e Médici não tem nada com isso, responsável é a União".

Ainda bem que nenhum dos ministros de hoje integrava a tribunal de 1979/80. Os ministros de 1979/80, se comparam aos ministros do Supremo da Era Vargas, Estado Novo, mas com o Supremo funcionando que autorizaram o ditador a entregar Olga Benário aos nazistas. (Ela nunca foi Prestes).

Esse general Chefe do SNI, poderosos, pedia a prorrogação da ditadura, pois era candidatíssimo a "presidente" em 1985. Foi o autor e realizador em comando de tudo o que aconteceu cm a Tribuna em 1981. Fui então depor na CPI do Terror que funcionava no Congresso. O relator Franco Montoro (depois seria governador de São Paulo) veio ao Rio me convidar, fui depor, construí um libelo nominal que durou 6 horas.

Esse libelo desapareceu completamente. Tempos depois precisei consulta-lo, (falo sempre de improviso), não conseguiram encontra-lo. Ninguém sabia do 1º de Maio, desse mesmo 1981, nova tentativa de prorrogação da permanência dos generais, no caso o mesmo Otávio Medeiros.

Foram incompetentes, a bomba era para explodir em outro lugar e não no carro, matando militares. Para os autores, um desastre. Era preciso fazer inquérito, a repercussão foi enorme. Garantiram a transição com a "eleição indireta" de 1985, monitorada por eles, chamada de "transição". E o inquérito?

O chefe do SNI providenciou tudo. Conhecia um coronel negro (já morto) que não seria promovido a general, chamou-o e determinou: "Você vai assinar o inquérito sobre o "Atentado do Rio Centro". Não terá nenhum trabalho, é só assinar. E será promovido a general" 

Não podia recusar, se o fizesse seria preso, teria um fim de carreira injusto. O inquérito foi o mais incompreensível, logo arquivado. Mas os generais torturadores continuaram mandando. Eleição direta só em 1989. Com tanto tempo sem povo, sem voto, sem urnas, surgiram oito candidatos.

O general Otávio Medeiros morreu 5 anos depois completamente desconhecido. Continuou morando em Brasília, ia ao supermercado sem segurança alguma, não era incomodado, ninguém sabia quem era. 

Fardado, parecia gigante. A paisana era um pigmeu.