Titular: Helio Fernandes

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

 HISTÓRIA DE PRISÕES E LIBERTAÇÕES, JULGAMENTOS NO SUPREMO, NÃO HÁ MAIS SIGILO, CONFIDÊNCIAS, TUDO É PÚBLICO

HELIO FERNANDES 

*Publicações históricas no Centenário do jornalista

Meus advogados, que não conseguiam falar comigo, estava incomunicável, entraram com Habeas-Corpus no Supremo, na época presidido pelo bravo, combatente e resistente Ribeiro da Costa.

Os advogados que me representavam, eram quatro. Sobral Pinto, que defendeu presos políticos em duas ditaduras, a do “Estado Novo” de 1937 e a dos generais de 64. Hoje é nome de edifício onde a OAB Regional e a IAB Nacional, diante de multidão de advogados, homenagearam o bravo, competente, lúcido e resistente, George Tavares. Isso aconteceu na semana passada.

Prado Kelly, notável advogado e jurista, depois presidente da OAB Nacional, Ministro da Justiça e finalmente Ministro desse mesmo Supremo. Adauto Lucio Cardoso, advogado, deputado, fez um libelo contra a minha prisão. 

Mais tarde também ministro do Supremo, saindo de lá, não pela aposentadoria e sim com o ato, o gesto e a convicção de em plena sessão tirar a toga e com audácia e determinação, jogá-la no chão, exclamando: “Este não é o Tribunal que eu imaginava”. E foi embora. 

E finalmente Prudente de Moraes Neto, umas das mais invulgares figuras que conheci. Depois de me defender, foi presidente da SUUMCC, daí surgiria o Banco Central. Diretos do Diário Carioca (este repórter, mocíssimo era diretos da redação, ele era o diretor responsável).

Usou a presidência dessa notável ABI para liderar ou melhorar a situação de dezenas de jornalistas, presos políticos. Sua atuação épica, histórica, maravilhosa, foi em relação ao jornalista Maurício Azêdo, (um dos presos mais torturados) . 

Durante três meses, Prudente quase todo dia ia ao Ministério da Guerra, conversar com o Ministro-chefe-do-Doi-Codi, tentando a libertação de um dos mais torturados de todos os tempos.

Finalmente conseguiu a libertação do Maurício. O próprio general Geisel disse a ele: “Amanhã às 9 horas, o jornalista será solto, o senhor pode ir buscá-lo”. Prudente foi com um amigo e o motorista. Maurício Azêdo, quase morto, foi entregue a ele. 

Emocionante, lancinante, comovente são as palavras obrigatórias para lembrar o ato e o fato. Abraçados Prudente e Mauricio choravam sem para, não há como descrever.

Há um foto que circulou durante muito tempo na internet. Impossível transcrever a emoção provocada pelo episódio, dois homens públicos notáveis, realizados, generosos, desprendidos, chorando abraçados, não conheço nada tão admirável. Era o auge da rebeldia construtiva. Depois da resistência do sacrifício e da tortura, as lágrimas não pela libertação mas sim pela liberdade. 

Julgamento assustador 

Todos diziam, até mesmo no círculo jurídico se comentava: “Com essa seleção de advogados, o Helio Fernandes será absolvido facilmente”. Exatamente o contrário. Fui enquadrado na Lei de Segurança, pediram 15 anos de condenação.

O julgamento terminou em quatro a quatro. Além dos extraordinários advogados, tive a sorte de ter na presidência do Supremo, Ribeiro da Costa. Pela Constituição e pelo Regimento Interno do Supremo, o plenário só poderia julgar com 8 ministros presentes, menos do que isso, nenhum julgamento.

Palavras do presidente Ribeiro da Costa: “Vou levantar a sessão por alguns minutos, voltaremos para cumprir a obrigação constitucional, desempatar a votação”. E esclareceu: “De acordo com o que está determinado na Constituição de 46 posso desempatar contra ou a favor do jornalista”.

Voltaram, num brilhante voto de improviso, me absolveu, com a afirmação – conclusão: “O jornalista não devia nem ter sido preso, acusado e julgado. Apenas publicou um documento assinado levianamente, o conhecimento do documento serviu a coletividade”. 

PS1- Em toda a história da República, fui e sou o único jornalista JULGADO pelo Supremo de corpo presente. Muitos, incluindo Rui Barbosa, foram PROCESSADOS, o que é inteiramente diferente. 

PS2- Hoje não há mais sigilo para coisa alguma. As novas tecnologias não vão matar o jornal impresso, longe disso. Só que agora a velocidade das notícias é a mesma que Einstein colocou na sua genial Teoria da Relatividade.

 

2 comentários:

  1. Mais uma aula de história que nos ajuda a entender e melhor combater a leviandade dos que sempre iludem o povo.grato.

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  2. Um dos maiores jornalistas de todos os tempos. Já li esse artigo várias vezes e năo me canso.

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