Titular: Helio Fernandes

sexta-feira, 5 de junho de 2015

HOJE, HÁ 50 ANOS, CASTELO JÁ ESTAVA NO PALÁCIO NO RIO, ESPERAVA O REFERENDO DO CONGRESSO. TODOS, EM VOLTA DELE, APAVORADOS COM COSTA E SILVA, AINDA LONGE DO RIO.
HELIO FERNANDES
04.06.15

Apesar de não admitirem qualquer citação a esse 1º de abril, foi nesse dia que houve a primeira prisão oficial. A de Miguel Arraes, governador de Pernambuco. Foi levado imediatamente para Fernando de Noronha, em 45 minutos era apresentado, preso ao governador. Coronel Costa e Silva (nenhum parentesco), da ativa. 

Pediu a Arraes e depois a este repórter: “Não diga que eu tratei você bem, aí me tiram daqui, é onde quero encerrar minha carreira”. 

Antes mesmo de referendado e empossado, Castelo nomeia 

O primeiro foi o general de Divisão, Ernesto Geisel, Chefe da Casa Militar. Apesar de isso não ser comum no Exército, o maior amigo de Geisel era o Tenente Coronel Golbery. (“No Exército, hierarquia é posto”, diziam e repetiam. Golbery começou mandando mesmo). 

Tortura, arrogância, incompetência 

Quando o general Leônidas diz ”o Exército não é INTRUSO na história do Brasil”, é verdade pela constatação, mas quase sempre precisa de uma justificação. Dessa vez, era a “salvação do comunismo, que está tomando conta do Brasil”. Ora, os comunistas perdiam na conspiração (1935) ou nas eleições, todas. 

O Congresso empossa Castelo 

Da mais alta tribuna do povo, Castelo Branco tomava posse como presidente, cheio de aspas e paetês. Sobral Pinto, grande conservador, totalmente anticomunista, famoso como defensor de presos políticos e pelas cartas que mandava, enviou uma a Castelo, com parabéns, no dia 9 de abril.

Anticomunista convicto, Sobral defendeu Prestes de 1936 em diante, ficaram grandes amigos. Mas os parabéns a Castelo Branco, duraram pouco. No dia 29, tomando conhecimento das torturas que dominavam o Brasil, mandou nova carta a Castelo. 

Sobral condena Castelo, o “intruso” 

Textual dessa correspondência: “General, por favor, rasgue a carta que mandei no dia nove, essa não vale mais nada. E o senhor é o único responsável. O senhor é Chefe do Estado Maior Geral do Exército, não pode estar fingindo de presidente, e torturando brasileiros”. Castelo tentou falar com Sobral, não conseguiu. 

Castelo não era um general Pinochet ou Videla, mas não fez nada para impedir a tortura 

O que coloquei no título é rigorosamente verdadeiro. Castelo não freqüentava os subterrâneos da tortura, (como gostavam de fazer Pinochet e Videla, para se divertirem à noite) mas sabia de tudo. Dois meses depois da posse, como as denúncias de tortura (e corrupção) se avolumavam, mandou o Chefe da Casa Militar investigar e “redigir um relatório minucioso”. 

Geisel foi, contou, Castelo arquivou 

Foi a vários estados, parou mais tempo, em várias cidades de Pernambuco, ouviu muita gente que estava presa e já fora torturada. Voltou, entregou um relatório a Castelo, denunciando tudo.

(Na época revelei isso, só não consegui cópia do relatório, nem ler suas 17 laudas. Castelo mandou arquivá-lo. O “presidente” queria que o Chefe da Casa Militar, dissesse, NÃO HÁ TORTURA EM LUGAR ALGUM). 

Costa e Silva chega ao Rio 

Também não era torturador, nem mesmo assistente. Assumiu o Ministério da Guerra por sua conta e risco, não conversou com Castelo. Ernesto Geisel e Golbery, que já passara para a reserva como general (tinha direito a duas promoções) era também presidente do Dow Chemical, a mais famosa fábrica de napalm do mundo, (ganhando fortunas com a guerra do Vietnã).

Apavorados com a possibilidade de Costa e Silva ser o sucessor de Castelo. Mas isso era uma verdade inabalável. 

A farsa do milagre econômico 

Roberto Campos, idiotamente nomeado por Jango embaixador nos EUA, assim que o golpe se concretizou, veio para o Brasil. Todo poderoso, mandando de verdade. Junto com Lincoln Gordon e o general Vernon Walters (que “assessorou” a FEB na Itália), implantaram um regime tão revoltante em matéria de truculência, violência e imprudência, que bastava o cidadão estar com uma bandeira do Brasil para ser preso.

Foi o governo mais “entreguista” da história, a palavra na moda. Empresas dos EUA vinham para o Brasil com todas as vantagens, privilégios e mordomias. Primeiro com Roberto Campos, depois com Delfin Netto, que começara como secretário da Fazenda de São Paulo. 

Os empresários brasileiros preteridos pelos americanos 

Ou aderiam ao golpe, (alguns apoiaram a derrubada de Jango desde o início). Outros não tiveram saída. Se entregavam à ditadura (já não mais identificada como REVOLUÇÃO e sim como GOLPE), ou iam à falência. Não existia uma terceira via. 

Os generais sentiam que não podiam mais se esconder 

Com menos de dois meses, as coisas iam se esclarecendo. Os generais assumiam sua face historicamente golpista, perseguiam ou favoreciam em porções iguais. De acordo com a posição, CONTRA ou a FAVOR do golpe.

As prisões estavam lotadas, o povão, enganado e faminto, não sabia o que fazer. Do ponto de vista econômico e financeiro, não havia saída nem solução. Politicamente tudo se ocultava com prisão e tortura. 

O Brasil naufragando, Castelo trata da sucessão 

Antes de se falar em “prorrogação” do mandato de Castelo, a eleição estava marcada para 15 de novembro de 1965. Pelo menos foi o compromisso de Castelo com Juscelino, para conseguir o referendo e apoio do Congresso. Mas logo Castelo provou que tudo o que dizia era “MENAS verdade”. 

Embaixadores possíveis adversários de Costa e Silva 

Continuava o pânico do planalto em relação ás pretensões do Ministro da Guerra. Tentando se prevenir, mandou o general Juracy Magalhães para Embaixador nos EUA. E Bilac Pinto, Embaixador na França. Castelo não conhecia nada de Costa e Silva. 

A viagem do Ministro da Guerra 

Depois dessas duas nomeações, Costa e Silva resolveu mostrar seu jogo, adorava cartas e pif-paf. (Não a revista do Millôr, mas o jogo), grande perdedor, devia a “todo mundo”.

Amigos que souberam de sua disposição, tentaram convencê-lo a ficar no Brasil. Viajou, e no aeroporto fez declaração, manchete de todos os jornais: “Embarco Ministro e volto Ministro”. Recado para Castelo, este não podia fazer nada. 

Ninguém falava com Lacerda

Adorado pelos militares, que consideravam que ele seria um grande presidente, ficou surpreendidíssimo: nenhum oficial, de qualquer patente, falava com ele. Gostava principalmente de duas coisas. Comprar e viajar. Em 1960, a eleição de presidente e de governador, teve uma novidade que não se repetiria. O presidente e o governador tinham um vice que se elegeria com seus próprios votos. 

O vice de Jânio era Milton Campos, do marechal Lott era João Goulart 

Formado o Comitê Jan-Jan (Jânio e Jango, adversários), se elegeram. Na Guanabara o vice de Lacerda era Lopo Coelho que perdeu para Eloy Dutra. Veio o golpe, Eloy cassado, Rafael assumiu, Lacerda resolveu viajar, “para promover a Revolução”.

Pediu audiência a Castelo, contou, ele achou ótimo. Medíocre, sofrível, assustado, vivia com medo. No aeroporto De Gaulle, em Paris, Lacerda deu entrevista coletiva, foi espinafradíssimo, respondeu revoltado e irritado.

Voltou, sentiu que estava ultrapassado. Não era golpista, tinha a obsessão da presidência. Quando depois de dias e dias de conversa com este repórter, assumiu publicamente a “Frente Ampla”, foi agredido violentamente pelos seus maiores amigos militares. 

PS - Com Lacerda apoiando a “Frente Ampla” e a prorrogação do mandato de Castelo, não tive dúvida nem saída. Escrevi artigo do qual gosto muito, mas que não precisa nem ser lido, está todo no título: “1965 – Carlos Lacerda, o candidato invencível de uma eleição que não vai haver”. 

PS2 – Pela décima vez, quando o fato se confirmou, Lacerda disse que eu adivinhava. Depois confirmou isso por escrito. Semanas depois Lacerda me mostrou um artigo, com o título: “Carta a um ex-amigo fardado”. Li perplexo e assombrado. Era fascinante e lancinante, para ler chorando. Deixava claro que não entendia a posição dos ex-amigos. 

PS3 – Pediu o artigo de volta, explicou: “Vou publicar no Globo, Roberto Marinho me disse que eu só escrevo pra você e para a Tribuna da Imprensa”. 

PS4 – Devolvi, as relações Lacerda-Roberto Marinho, sempre foram conturbadas, tumultuadas, perturbadas. Teve grande repercussão. 

PS5 – Lacerda não contava nem constava mais da lista de presidenciáveis. Castelo, Geisel e Golbery, se reuniram e fizeram um fato inédito que o Exército repudiou mas não pôde anular. 

PS6 – Ernesto Geisel era general de Divisão, foi promovido a Exército, Quatro Estrelas, não estava nem na lista. 15 dias depois era indicado para o STM (Superior Tribunal Militar), era necessário ser Quatro Estrelas e da ativa. 

PS7 – Golbery que já passara para a reserva, foi colocado no TCU, Tribunal de Contas da União. Consideravam que assim, não seriam perseguidos por Costa e Silva. 

PS8 – Em setembro de 1969 quando Costa e Silva teve o derrame e considerado “incapacitado”, os dois se apresentaram, voltaram para a política. 

PS9 – Passou muita coisa até chegar a esse 1969. No dia 1º de outubro ainda de 1969, assumiu provisoriamente uma Junta Militar, um general, um brigadeiro, um almirante, que eu imediatamente identifiquei como os “Três Patetas”. 

PS10 – Era impossível dizer outra coisa. 24 horas depois mais um sequestro e um desterro na minha vida. Fui mandado para Campo Grande, hoje capital do Mato Grosso do Sul. Por que “Três Patetas?”. Não era animosidade, eu vi primeiro
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(matéria republicada a pedido dos internautas).
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