Titular: Helio Fernandes

quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

Fidel: símbolo de uma Era e de uma Revolução, sem nenhuma dúvida um ditador irrecuperável

HELIO FERNANDES

*Matéria de arquivo

No fim do dia 31 de dezembro de 1958, praticamente na madrugada de 1959, um personagem chamado Fidel Castro, começava a entrar na Historia. Morrendo ontem aos 90 anos, eterniza essa permanência, é lembrado para sempre. Morre mas não desaparece. Pelo contrario, fica em evidencia, garante a relevância e a reverencia que muitos lhe negaram em vida. Mas sempre foi ditador, adorava o poder incontestável e incontrastável.

Combatido, temido, respeitado, consagrado, insultado, violento, sem fazer concessão a ninguém, dominando uma pequena ilha, conseguiu colocá-la no mapa do mundo e não apenas geograficamente. Embora não tenha obtido o sucesso político que esperava, foi o grande revolucionário de uma época.

Logo nos primeiros tempos, no dificilimo1959, conquistou a admiração do mundo. Ele e Che Guevara, centralizaram as atenções do mundo, embora projetassem caminhos diferentes. Seus roteiros de vida eram igualmente revolucionários, mas tinham temperamentos, personalidades e objetivos, completamente diferentes.

Fidel Castro queria libertar Cuba. Che Guevara pretendia libertar o mundo.

Em 1960, candidato a Presidente, Janio vai a Cuba 

Oportunista, sentindo a popularidade crescente de Fidel. Favorito para a eleição do final do ano, em março Janio vai visitá-lo. Freta um avião, leva 30 pessoas. 24 jornalistas. Ele e Dona Eloá. Adauto Cardoso, que pretendia ser Ministro da Justiça, e não foi. Afonso Arinos de Mello Franco, candidato a Ministro do Exterior, e o primeiro a ser nomeado. Ficamos lá 9 dias, como sempre em todas as viagens, escrevia diariamente.

1959, um ano dificílimo, precisava fazer varias coisas ao mesmo temo. Faltava tudo, desde transporte a alimentação. Nesse 1960 em que estivemos lá, já existiam os embargos americanos, os culpados de tudo. Mas andávamos nas ruas, sem segurança, era aplaudido, apesar das prisões já estarem lotadas, e o fuzilamento ser uma regra cruel mas insistente. Os fins de noite eram invariavelmente na embaixada do Brasil.

O relacionamento diplomático era excelente. O embaixador do Brasil, Vasco Leitão da Cunha, do primeiro time do Itamarati, logo depois Ministro do Exterior. Em 1964 os ditadores que tomaram o poder aqui, romperam relações. Nada mais compreensível. Se dizendo anticomunistas, não podiam ter relacionamento com ditadores comunistas (idem, idem com a União Soviética).

Inexplicável e inacreditável: a ditadura dos generais torturadores acabou em 1979. Mas o primeiro embaixador em Cuba, só chegou lá em 1999,20 anos depois. Por acaso, foi uma grande figura, Luciano Martins, sociólogo, escritor, exilado em Paris durante a ditadura. Mas foi embaixador em outra ditadura.

Fidel: o fazedor e o brigador com amigos

Assumiu com 70 por cento de analfabetos, em 5 anos, não existia mais nenhum. Também impossível saber como conseguiu construir 8 famosos Hospitais-Universidades, iguais aos melhores do mundo. Com 10 anos no poder, existiam médicos cubanos, praticamente em todos os continentes. Incluindo o Brasil.

Mas não respeitava nem os amigos. Meses depois de chegar ao poder, um dos melhores, mais íntimos e mais brilhantes, Camilo Cienfugos, desapareceu. Nunca foi encontrado, mas se soube: Fidel mandou jogar o amigo no tumultuado mar entre Cuba e a Florida.

Seu relacionamento com Che Guevara, era diário. Mas as divergências também. Nomeou Guevara Presidente do Banco Central, como se ele fosse um Meirelles qualquer. Revolucionário verdadeiro, se considerando obrigado a salvar o mundo, só pensava em deixar Cuba, se entregar á luta, em vez de ficar fechado num escritório. Fidel pressentia isso, ficava preocupado. A seu modo, gostava de Guevara. Mas surpreendentemente tinha inveja do amigo. 

Não demorou muito, num congresso em Roma, encontrou com o jornalista Jean Jaques- Servan Screibe , diretor proprietário de um semanário mais importante da França .Já tendo decidido seu destino, resolveu fazer humor e confissão. Disse: "Se despeça de um revolucionário presidente do Banco Central. Fique atento com as noticias que virão de Cuba".

Guevara abandona Cuba, Fidel e o passado

Não demorou muito, Guevara deixou Cuba, quase sem se despedir de Fidel. Durou poucos meses. Traído, atraiçoado, caiu numa cilada armada por alguns que considerava amigos. Fidel recebeu logo a noticia, se recolheu a um dos palácios, tinha vários. Não derramou uma lagrima. Na verdade, Fidel não chorava, perdão, uma única exceção. Quando a filha pediu asilo nos EUA, sentiu o golpe, chorou. Não pela filha, mas pela repercussão negativa do fato. Para ele pessoalmente e para o governo ditatorial.

1960, 1961, 1962

Os embargos, uma ruína. Todo o ano de 1960, foi de desgraça. Em 1961, logo depois da posse de Kennedy, o ataque militar a Cuba, pela Baia dos Porcos. Estava tudo preparado, a derrota dos Estados Unidos, estrondosa. Em 1962, numa gravação aérea, a descoberta de que existiam aviões nucleares se abastecendo em Cuba, poderiam entrar em ação, a qualquer momento.

Foram aqueles 15 dias em que as manchetes de todos os jornais do mundo, e as televisões, estrondavam repetidamente: “O mundo poderia estar caminhando para a tão temida guerra nuclear”. Que foi impedida no ultimo minuto. Ainda estávamos longe da Internet, todos acalmaram o mundo ao mesmo tempo.

Fidel não era comunista

Converteu-se depois, com a convivência e a submissão á União Soviética, que fornecia tudo que Cuba precisava, principalmente petróleo. Comunista desde adolescente era o irmão Raul. A quem teve que passar o governo em 2008, por motivo de saúde. Nesses tempos, Raul fez modificações importantes, que Fidel não quis fazer por vingança e insensibilidade. 

Tratava-se da remuneração dos médicos e atletas de vários esportes, que iam para o exterior, trabalhar. Fidel exigia que mandassem para Cuba, 100 por cento do que ganhavam. Se não cumprissem, não poderiam voltar ao país. Raul fez um acordo imediato, e que agradou a todos. Os que trabalhavam no exterior, podiam ficar com 80 por cento do que ganhavam e mandar 20 por cento para Cuba, tinham muitas isenções.

Poderia continuar escrevendo indefinidamente sobre Cuba e Fidel. Um só exemplo: em 1987, o ultimo acontecimento promovido e dirigido por Fidel. Um seminário sobre divida externa, hoje divida publica, que atingia também Cuba.

Mais de 2 mil convidados, 47 brasileiros, incluindo Lula, que 2 anos depois, seria candidato a presidente pela primeira vez.

Desses 47 brasileiros, só 2 ocuparam a tribuna. Luiz Carlos Prestes, que não conhecia muito bem o assunto, levou um texto escrito. E este repórter, apaixonado pelo assunto, mostrei o perigo para o futuro de todos os países, "endividados". Agora, 29 anos decorridos, como eu disse, a situação piorou para todos.


Para Cuba, o desastre catástrofe do fim da União Soviética, na noite de Natal de 1991. Foi a ultima crise que atingiu Cuba. Fidel estava muito desgastado, praticamente deixou o país estagnado, passou a viajar pela America do Sul e Central. Queria implantar um "império comunista", liderado por ele. Não conseguiu. Morreu respeitado pelo silencio, mas totalmente impopular.

Se pudesse, iria ler as bobagens exatamente iguais, ditas por Lula e Maradona: "Ele foi um pai para mim". Ele não foi pai para ninguém, era sempre, "o comandante". Uma vez escrevi, "desconfio que Fidel dorme sem tirar a farda, com medo de deixar de ser o comandante".

Dos que escreveram sobre Fidel, ontem, o único lúcido, sensato, esclarecido, inclusive porque esteve exilado lá por 1 ano, foi Fernando Gabeira. Perguntou em poucas linhas ou palavras: "Tantas mortes, tanto exílio, tanta tortura. Tudo isso valeu a pena?".

Para Fidel, sempre ditador, uma cremação de estadista. Se não houver pressão ou constrangimento, no domingo, as maiores personalidades do mundo, estarão em Cuba. Mesmo repetindo o lugar comum obrigatório: "Fidel será julgado pela Historia"

* A COLUNA VOLTARÁ CIRCULAR EM 4 DE JANEIRO DE 2020.


VOTOS DE FELIZ NATAL E ANO NOVO, AOS AMIGOS LEITORES E FAMILIARES 







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